FILHOS
Há silêncios mais acompanhantes
do que certos barulhos.
A medida do valor da sua gente
pode
ser a presença de horas
silenciosas, em casa.
Inútil falar mal, os filhos
não nascem
das palavras dos pais.
Faça-lhes o bem,
porque
eles nascem das suas obras.
Quantas vezes, querendo provar
que há quem manda em casa,
se prova antes que não há mais
ninguém mandando, em casa!
quinta-feira, 30 de julho de 2015
quarta-feira, 29 de julho de 2015
LINDA QUARTA-FEIRA PRA VOCÊ
Não tenha medo de brilhar.
Não sinta falta de nada,
O Universo está dentro de você,
pronto para se expressar.
No mundo da luz você também
é uma estrela, embora não
queira acreditar.
Às vezes você fica temeroso.
Seja firme, ouça e sinta a luz,
deixe sua estrela brilhar.
Você é especial !
Beijos em teu coração
Uma Linda Quarta-feira
Amiga..
Que a Paz e o Amor estejam
sempre presente em sua vida
Sinta o que você diz.. Com carinho!
Diz o que você pensa..
Com esperança!
Pense no que você faz...com fé!
Faça o que você deve fazer...
Com muito amor...
Mesmo caminhando entre espinhos
com muitas pedras nos caminhos
continue caminhando com coragem
e confie no poder daquele que é maior
pois somente Ele poderá dar-te o melhor
para continuares seguindo a viagem !
Uma Linda Quarta-feira
Amigo é aquele que toca sua ferida,
vibra com as suas vitórias,
ou faz piadas para amenizar o problema.
Amigo na verdade é quem
te ama e ponto final. É quem tentou e fez.
É quem sorri sem achar motivo aparente,
ao achar aquilo que você
nem sabia que procurava.
É aquele que te ouve no telefone
com a mesma atenção
de quem está olhando nos olhos.
Amigo é quem ouve e fala com o olhar.
Amigo é vc....
Te Adoro!
29 de julho de 2015 | N° 18241
MARTHA MEDEIROS
Anacrônica
Não me preocupo em ficar velha (mentira). Desde que nascemos, estamos envelhecendo, cada dia com menos joelhos, visão e memória. Sabendo levar com humor, tudo certo. Mas ficar obsoleta é preocupante. Já começo a antever a solidão que me aguarda. Onde catar meus pares? Será que me transformarei naquelas malucas que zanzam pela noite falando sozinhas em busca de uma realidade que não existe mais?
O Facebook não tem culpa de tudo, só de uma parcela da minha sensação de anacronismo: leio os posts de amigos inteligentes e espirituosos, e tudo me parece tão esperto, moderno, atualizado, divertido, bem sacado e oportuno, que acabo me considerando uma personagem de filme de época que esqueceu de sair de cena.
Além do conteúdo das postagens, todos sabem corrigir defeitos em fotos, baixar vídeos complicados, colar matérias, fazer intervenções nas imagens e eu matei quase todas essas aulas. Até o Papa usou um tablet para se registrar como peregrino da próxima Jornada Mundial da Juventude. Outro dia, um amigo que é respeitado no Brasil inteiro, craque em seu ofício, um cara antenado, postou uma singela pergunta no Face: alguém me ensina como fazer parágrafos nos comentários sem enviá-los antes de terminar de digitar? Alívio para minha humilhação. Também não sei, também não sei.
Mas não estou obsoleta só nas redes sociais. É em tudo. Meus conceitos caducaram. Não espalhe, mas ainda gosto de algum romantismo, aprecio quem entra no jogo da sedução, faz seu papel, curte o flerte – nem precisa estar tão apaixonado, basta que encene, decore suas falas. Até dispenso o amor, fico com o simulacro, acho que evoluí (se bem que o fato de ainda gostar da mise-en-scène já me condena – e nem ouso confessar que, quando há amor de verdade, fico ainda mais feliz).
Feliz! Coitada de mim, que ainda arrisco trazer a público palavra tão retrô. Angustiada, medicada e vulgar, é isso que esperam de uma mulher condizente com seu tempo.
Só que não tenho mais meu tempo. Ele não é ontem, não é hoje e o amanhã se assemelha a um gigantesco aspirador de pó – o pó sou eu. Estou soando dramática? Exagerada? Pois é, até isso é antigo.
Eu apoio o casamento gay, sou a favor da descriminalização do aborto, viajo sozinha quando dá na telha, meu trabalho me sustenta e ainda assim me sinto como se recebesse mesada de marido e não pudesse votar. Música eletrônica me atordoa, ostentação me nauseia e meus heróis, em vez de morrerem de overdose, estão chegando aos cem anos. Meu sonho de consumo é encontrar outros sobreviventes nesta ilha em que estou me exilando. E uma tevê que não envergonhe minha filha diante dos amigos – sou a única terráquea que ainda não tem uma de LED.
terça-feira, 28 de julho de 2015
28 de julho de 2015 | N° 18240
CARPINEJAR
Não deixe de ir
Vejo o enterro como uma majestosa sessão de cinema. Cada um que entra no velório é um derradeiro espectador de uma vida. De uma vida que não irá se repetir.
Manteremos o respeito dos trajes negros e dos gestos comedidos para homenagear um idioma que se extingue, um jeito de falar que desaparece, um modo de amar que some do convívio.
Não há como não ser inesquecível. O cenário nos remete às salas antigas de exibição: o tapete vermelho e as cadeiras ao redor do caixão. É sentar e lembrar as principais cenas de uma longa trajetória.
Não se nasce impunemente, assim como não se deve morrer no esquecimento.
A despedida não traz apenas tristeza, mas uma confusão de sentimentos envolvida no olhar profundo. Saímos da pressa do presente, ausentamo-nos das obrigações e dos compromissos para eternizar o que o outro representou em nosso passado. O ritmo lento da recordação encharca os olhos. Não é mais o rosto que carrega a lágrima, é a lágrima que carrega o rosto.
A música composta de soluços, cumprimentos e sussurros ao fundo lembrará o piano dos filmes mudos. O batimento cardíaco é o nosso pianista.
Não há superfície que nos separe da sensibilidade das coisas. Não há pele nas palavras. Não há proteção para os ouvidos.
Ficaremos leves repetindo incessantemente os pêsames.
Apesar da dor, não podemos desperdiçar o momento, não podemos renunciar à chance de falar o que sabemos e abraçar os espectadores. É acrescentar um capítulo inédito ao romance.
Não importa quem conheceu mais ou menos o falecido, quem era mais próximo ou mais distante. O fim torna qualquer um íntimo. Todos têm o ingresso para a saudade.
Trata-se de um momento fundamental, o de montar o copião de uma biografia.
Ouvir as histórias alheias e dar-se conta de que não conhecíamos tudo.
Descobriremos um novo lado, uma nova personalidade daquele que partiu.
Talvez desvendar que um homem sério também era divertido, que uma mulher introspectiva também era apaixonada.
Filhos ganham versões diferentes dos pais, esposas têm a surpresa das palavras ditas aos amigos, maridos recebem recordações antes do namoro.
Os mistérios serão solucionados, os passatempos serão denunciados, os traumas serão desfeitos.
Os familiares emendarão, em ordem cronológica, fotograma por fotograma da infância, da adolescência, da maturidade e da velhice de seu parente findo.
As festas de aniversário de uma pessoa estarão reunidas numa só celebração.
O enterro é uma ilha de edição, onde se juntam fragmentos dos contemporâneos, relatos de interessados, causos dos colegas, com o propósito de resumir e entender o significado de uma alma.
Não deixe de se despedir de um amigo. Será a última e, ao mesmo tempo, a primeira vez que assistirá a uma vida por inteiro.
sexta-feira, 24 de julho de 2015
A vida é uma química maravilhosa.
Sonhamos com a potencia máxima.
Acionamos uma expectativa louca soltando
adrenalina.
Sentimos que poderemos ser felizes sim somos do
bem.
Precisamos ficar ótimos e sair em busca das outras
metades.
Ou simplesmente uma outra metade que completa o
inteiro.
Vivemos nas luzes que abrimos caminhos.
Fechamos alguns e abrimos novos.
Encontramos nossa bússola
e assumimos o comando da vida.
e assumimos o comando da vida.
Façamos o favor sejamos felizes e vivamos a
vida.
Sol Holme
LINDO DIA ANJO AMIGO.
Pessoa iluminada
Não existe absolutamente nenhuma diferença entre
A pessoa iluminada e a pessoa não-iluminada,
nem mesmo um centímetro de diferença.
A pessoa iluminada sabe disso
E a não-iluminada não sabe - isso é tudo.
A pessoa não-iluminada acredita na distância,
Na diferença, daí o fato de ela a criar.
(Osho)
LINDO DIA MEU ANJO!
''Não quero olhar para trás,
lá na frente, e descobrir
quilômetros de terreno baldio
que eu não soube cultivar.
Calhamaços de
páginas em branco
à espera de uma história que se parecesse comigo.
Não
quero perceber que, embora desejasse grande,
amei pequeno. ''
Ana
Jácomo
♥Beijão no seu lindo coração♥
Jaime Cimienti
Ficções, cotidiano e nostalgias do Flávio Dutra
DIVULGAÇÃO/JC
A coletânea Crônicas da mesa ao lado partiu do blog ViaDutra
A coletânea Crônicas da mesa ao lado (Belvedere, 96 páginas, www.bartlebee.com.br, capa de Cezar Arruê), do consagrado jornalista e blogueiro Flávio Dutra, partiu do blog ViaDutra um descaminho (http://viadutras.blogspot.com.br) em 2009. Curtições, comentários, compartilhamentos e incentivos no Facebook e uma avaliação de mais de 500 textos por Diego Lock Farina originaram o livro, de quatro capítulos. O prefácio é de David Coimbra, que diz: "Gostaria de ter escrito algumas crônicas do livro e talvez faça plágio não autorizado de outras".
Flávio Dutra, porto-alegrense formado em Comunicação Social pela Ufrgs, especializado em Jornalismo Empresarial e Comunicação Digital, trabalhou nos principais jornais e emissoras de rádio e TV do Rio Grande do Sul, presidiu a Fundação Cultural Piratini (TVE e Rádio FM Cultura), atuou como secretário de Comunicação do governo do Estado, da prefeitura de Porto Alegre e frequenta redes sociais, especialmente o Facebook.
Crônicas da mesa ao lado apresenta crônicas e frases no final do volume, que revelam a habilidade, a síntese e a objetividade do jornalista experiente, mescladas com o humor, a vivacidade e o olhar dos cronistas de até pouco tempo atrás, aqueles que biografavam o cotidiano sem se preocupar demais com o próprio ego ou com emitir opiniões. Sim, a gente sabe que a crônica se tornou, para o bem e para o mal, um pequeno artigo de opinião ou de egolatria.
Na primeira parte do livro, que dá nome ao volume, o autor conta histórias e adverte que nem tudo é verdade. O gauchão que financiava a modista; coquetel de Viagra com Cialis; fetiches; o homem que amava panturrilhas e o que amava joanetes e a estranha senha a ser usada no motel são alguns dos temas com tom gostoso de conversa de bar.
O segundo capítulo, Crônicas do cotidiano, retrata a vida real, por vezes com base em conversas alheias. Fala de gafes, da estranha exigência de um famoso cantor, do homônimo do Flávio Dutra, da história do Mário Cinco Paus e de gauchismo, entre outros assuntos.
Crônicas da nostalgia é a terceira parte. Dutra fala dos filmes, dos beijos e dos amassos no cine Ritz; da turma de Petrópolis que sequestrou o bonde Petrópolis (Flávio nega que participou); do romance e pedido de casamento do coronel Dastro em meio à fuga e perseguição do bandido Melara; das aventuras de Toniolo com PMs e, ao final, apresenta uma mensagem na qual diz sentir nostalgia do futuro, do que não fará, e desde já, bota a culpa no tempo pelas coisas que não conseguirá realizar.
Ouvido na mesa ao lado, parte final, fecha com graça e leveza, com frases espirituosas, como "Quem fica se achando é porque não se procurou direito" e "tem instituto de pesquisa que deveria cair para a segunda divisão".
É isso. Flávio Dutra falou e disse. E muito bem. Com muita ginga, inteligência e graça. Ótimo para todos.
Jaime Cimenti
O Café do Porto e a Padre Chagas
O Café do Porto da Padre Chagas, um dos filhos da querida Cacaia Bestetti, acabou de completar, em 18 de julho, vinte gloriosos aninhos. É um guri, ainda, perto do Café Tortoni, de Buenos Aires, que nasceu em 1858, e do Café de La Paix, de Paris, que é de 1862, mas deixa a pátina do tempo ir caindo de leve, e o Café do Porto, que começou pequeno, numa garagem, vai continuando sua trajetória como uma instituição da cidade. É um café que mudou a Padre Chagas, o Moinhos de Vento e também Porto Alegre.
A Padre Chagas, segundo os registros imobiliários, tem cento e poucos anos e, antes do Café do Porto, do Jazz Café na Fernando Gomes (Calçada da Fama) e do saudoso Azteca, na Padre Chagas, há vinte anos, era uma rua com casas residenciais, edifícios de apartamentos e poucos prédios comerciais, com salas e algumas lojas. De noite e nos fins de semana, tinha pouca vida, a Padre, uma rua pequena, de aproximados 600 metros de extensão.
O Café do Porto e outros estabelecimentos que vieram depois deram vida e movimento ao bairro e, de quebra, estudos mostram que bares e restaurantes propiciam mais segurança aos moradores das redondezas.
Pois temos mais é que comemorar o aniversário do Café, como gosta de chamá-lo a Cacaia, e desejar campai, longa vida para ele, que já faz parte da nossa família e do nosso cotidiano. Ele é a continuação de nossa casa, de nossa sala, onde podemos encontrar parentes, amigos, conhecidos e desconhecidos, fazer novos amigos, inclusive novos amigos de infância, e onde podemos, claro, passar um tempo sozinhos, lendo, trabalhando, pensando ou simplesmente tomando espumante, vinho, cerveja ou refri, assistindo ao incomparável desfile das deusas da Padre Chagas, possivelmente a maior e melhor passarela de beleza do planeta.
Nas quartas-feiras, quando os músicos Cláudio Vera Cruz ou o Rosa Franco, afinados, tocam e cantam, a turma do Léo, Talasca, Papaléo, Telmo, Marcão, Zanatta, Adonis, Bresolin, Nonno e outros curtem uma happy por lá, sempre conversando sobre assuntos sérios e comportadíssimos, como convém a pais de família.
O publicitário, músico, cronista e escritor Rubem Penz vai ministrar uma oficina de crônica no Café do Porto, em versão café espresso, mas, imagino, sem prejuízo de outros líquidos que o Café tem para servir. Normalmente, as oficinas do Rubem são regadas a cerveja e outras bebidas, no Apolinário, e a combinação tem funcionado bem.
Pois é, o Café do Porto já está no rumo da maioridade, dos 21, e já se tornou patrimônio social, afetivo e gastronômico da gente. Deus o conserve, ilumine e lhe dê mais uns 100 anos de vida.
Sempre é bom lembrar que, assim como uma casa não é um lar, um prédio não é um café. Café que se preze tem que ter alma, história, pessoas, palavras, emoções e sensações no passado, presente e futuro. Tipo assim o Café do Porto.
A propósito...
Pesquisas recentes mostraram que o consumo moderado de café é saudável para o coração, além ser útil para fortalecer a imunidade, proteger o fígado, ajudar no diabetes, cálculos e prevenção de câncer e também para auxiliar na conservação da memória. Ah, pesquisa recente mostrou que duas ou três xícaras de espresso contêm cafeína suficiente para poder melhorar a situação de pessoas deprimidas, que são muitas atualmente. Mas deguste com moderação, beba devagarinho, curta o aroma, a aparência e o gosto do café, convide os parentes e amigos, consulte seu médico e seja cada vez mais feliz. Cafezinho, preferência nacional.
quarta-feira, 22 de julho de 2015
sábado, 18 de julho de 2015
19 de julho de 2015 | N° 18231
CARPINEJAR
Mexendo nas feridas
Demoro a me recuperar dos tombos. Não aguento o período de
recuperação.
Sempre mexo nas cascas dos machucados. Nunca a minha pele
teve a chance de se regenerar naturalmente. Passo do limite, começo retirando
as bordas secas e invado o úmido da purgação.
Jamais me controlo, desde a infância.
Na escola, cutucava o pisado debaixo da classe. Ao apressar
o seu fim, retomava o seu início. Não me movia pela curiosidade infantil e biológica
de entender o processo, e sim para me livrar do incômodo. Óbvio que a calça do
uniforme vivia manchada de sangue. Eu mesmo encontrava um jeito de me ferir e
ampliar a data de validade da ferida.
Esfolar o joelho representava meses de recuperação. Transformava
a expectativa convencional de uma semana em longo martírio de coceira.
Minhas pernas estão depiladas involuntariamente nas canelas.
De tanto mexer nas batidas, criei cicatrizes onde não deveria constar nenhum
sinal.
Acentuava a gravidade dos escorregões e encontrões do
futebol.
Quem me dera se a minha impaciência estivesse reduzida à epiderme
dos costumes.
Infelizmente, carreguei a mesma ânsia para dentro de namoros
e de casamentos. Não percebia que as piores ofensas acabavam por aparecer no
meio da briga (as que desencadeavam a discussão eram simbólicas, de menor
gravidade).
Quando surgia uma insatisfação, não deixava esfriar. Não
aceitava que cada um se aquietasse em sua solidão para sarar o ruído com silêncio
e pensamento.
Não há como evitar acidentes e quedas na vida a dois, mas não
realizava o simples curativo perante um revés: limpar a zona infeccionada das
palavras, cobrir o assunto por dois dias e aguardar a melhora.
Já coçava com as unhas compridas. Já cavoucava a chaga. Já pretendia
resolver na hora. Já pressionava a minha companhia a tomar uma decisão, a
explicar seu posicionamento, a emitir uma sentença.
De algo muito tolo (uma piada no contexto errado, uma frase
torta, um descontentamento com um gesto), convertia em tudo ou nada, naquele
extremismo de exigir desculpa ou terminar a relação.
Não admitia a existência breve de uma pequena ferida. Não
guardava as mãos. Não saía de perto.
Fixava-me no desentendimento a ponto de ampliá-lo em impasse.
O que é físico é também emocional.
Assim como no corpo, um ferimento na pele do orgulho, diante
da insistência de insultos e acusações, pode dar origem a uma lesão crônica,
que persistirá durante anos.
19 de julho de 2015 | N° 18231
ANTONIO PRATA
Dormir é para os fracos
Quinze constatações a partir da paternidade: uma crônica de
autoajuda para os que pretendem procriar – ou talvez, mais ainda, para os que não
pretendem.
1 – Antes de ter filhos, eu era um vagabundo que ficava
reclamando, sem razão, de não ter tempo pra nada.
2 – Depois de ter filhos, eu sou um pobre-diabo que fica
reclamando, com razão, de não ter tempo pra nada. (Se hoje me dessem três meses
com o tempo livre que eu tinha há dois anos, eu conseguiria aprender esperanto,
escrever Anna Karenina e treinar pro Ironman).
3 – Se eu tivesse um minuto pra pensar a respeito da
paternidade, provavelmente me daria conta de que estou vivendo um dos momentos
mais gloriosos da minha breve passagem sobre a Terra: estou acompanhando o
desabrochar de pequenos seres humanos feitos com metade dos meus genes e metade
dos genes da mulher amada.
4 - Se eu não tenho um minuto pra pensar a respeito da
paternidade é porque estou exercendo a paternidade, o que significa, entre
outras coisas: tentar evitar que um desses pequenos seres humanos ponha na boca
a mão que acabou de meter na fralda suja de cocô; tentar convencer o outro
pequeno ser humano de que não dá para vermos o caranguejo, agora, pois o
caranguejo mora em Ubatuba, nós moramos em São Paulo – e são duas e trinta e
sete da manhã. Tais atividades, convenhamos, deixam pouco espaço para a
contemplação.
5 – Felizmente, devido a uma simpática trapaça cognitiva,
pregada pela seleção natural, o cocô dos nossos filhos nos parece muitíssimo
menos repulsivo do que os cocôs do resto da humanidade. (Infelizmente, não a
ponto de nos esquecermos que aquilo na fralda, nas costas, nas pernas ou na mão
do pequeno ser humano continua sendo cocô.)
7 - Depois de ter filhos, os minutos destinados ao próprio
cocô se transformam num raro e beatífico momento de paz pelo qual os jovens
pais anseiam como um monge por sua meditação.
8 - (Não é incomum pais neófitos simularem dores de barriga
para poderem se trancar no banheiro várias vezes ao dia e: ler rótulo de creme
hidratante, dar “like” na foto do gato da prima, contemplar os azulejos num
torpor quase místico).
9 - Ninando um bebê, me descubro capaz de executar funções
com partes do meu corpo que, até ter filhos, julgava completamente ineptas. Consigo
abrir e fechar uma maçaneta com o cotovelo – sem fazer barulho. Consigo regular
o dimer com a bunda. Consigo abrir e fechar o mosquiteiro com o nariz. Coço o
queixo na estante de livros, as costas no armário embutido, a testa no prato da
samambaia. Se tiver uma única mão livre, posso fazer o solo de bateria do John
Bonham, em Moby Dick, de trás pra frente – só não faço porque iria acordar o
bebê.
10 – Antes de ter filhos, eu achava o fim da picada pais que
trabalhavam com: babá, biscoito recheado, televisão no carro.
11 – Hoje, procuro uma folguista pro fim de semana (pago
metade do meu salário e dou meu carro como bonificação), negocio “Só mais uma,
já é o terceiro pacote!” e imploro “Não chora! Olha o filme do Senhor Batata! A
Menina Moleca! A Galinha Pintadinha!”.
12 – Galinha Pintadinha é a imagem da Besta.
13 – Galinha Pintadinha é uma bênção divina.
14 – Dormir é para os fracos.
15 – Eu sou fraco.
RUTH DE AQUINO
17/07/2015 - 22h35 - Atualizado 17/07/2015 22h39
Um dia da caça, outro do caçador
A democracia brasileira vive um momento de ouro, porque não
poupa ninguém
A cena dos três carros de luxo, uma Ferrari, um Lamborghini
e um Porsche, apreendidos da casa do ex-caçador de marajás e ex-presidente
impedido Fernando Collor, é um bálsamo para todos que sempre se sentiram meio
quixotes neste país, em luta contra moinhos de vento.
É compreensível que empresários bilionários ostentem
brinquedos assim e se sintam mais machos enfileirando na garagem suas máquinas
potentes e incompatíveis com o trânsito brasileiro. Mas, e quando se trata de
políticos? Só muita cara de pau, complexo de inferioridade e problemas de
caráter explicam essa obsessão em um congressista ou homem público, num país
com tantos desafios básicos e graves.
O valor total dos três carros, estimado em cerca de R$ 5
milhões, é detalhe. Milhões e bilhões são jogados pelo ralo da corrupção todo
dia. Ninguém consegue acompanhar o montante das propinas na Operação Lava Jato.
Mais reveladora é a dívida de Collor com o IPVA das três máquinas, R$
343.480,48. Quem caiu por um Fiat Elba sujismundo deveria ter virado
colecionador de tudo, menos de carros. Sempre faltou visão a esse político
afeito a surtos arrogantes e a golpes baixos.
Collor reagiu como... Collor. Com bravatas e chiliques. O
senador se disse “ultrajado” com a apreensão em sua propriedade, a Casa da
Dinda. “Estamos no terreno do vale-tudo!” Chamou os investigadores de
“facínoras que se dizem democratas”.
Policiais federais, com mandados de busca e apreensão
assinados por ministros do Supremo Tribunal Federal, levaram também material da
emissora de TV do senador, em Maceió, repetidora da Globo. Era madrugada de
terça-feira. A ação, acatada pelo STF a pedido do procurador-geral da
República, Rodrigo Janot, foi batizada de Politeia, que seria uma república
grega, caracterizada pelos direitos civis, pela ética e pela virtude.
Com uma biografia pontuada de episódios ainda obscuros,
Collor foi redimido por seus pares e é senador pelo Partido Trabalhista
Brasileiro – o PTB fundado por Getúlio Vargas em 1945. E pensar que Collor
quase foi presidente da CPI da Petrobras, indicado pelos governistas.
Lula elogiou Collor como um dos mais leais de sua base, em
2009. Abraçaram-se num palanque de Alagoas, em Palmeira dos Índios. Lula disse
que tanto Collor quando Juscelino Kubitschek tinham sido presidentes que
viajavam para “sentir o drama do povo”. O que Lula dirá agora? Nada. Até porque
muito ainda deve surgir sobre a relação íntima de Lula com a Odebrecht.
Os que mais se comoveram com o sentimento de ultraje de
Collor foram o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, e o presidente do Senado,
Renan Calheiros. Ambos são alvos da Lava Jato, acusados de receber propinas
robustas de fornecedores da Petrobras.
O show de Collor foi roubado por seus irmãos camaradas do
PMDB, Cunha e Renan. Se pensássemos num filme que resumisse os protagonistas da
semana, poderia ser Os três patetas, na versão mais carinhosa, ou Os irmãos
metralha, na versão mais dura. Dos três, Collor é o mais inofensivo, o menos
perigoso, por não passar de figurante canastrão no grande palco político.
“É tudo vingança do governo. Parece que o Executivo quer
jogar sua crise no Congresso”, disse o presidente da Câmara, Eduardo Cunha.
Cunha foi acusado pelo lobista de empreiteiras e delator da Lava Jato Júlio
Camargo de receber US$ 5 milhões diretamente dele, em 2011. O Brasil assistiu
ao depoimento, gravado em vídeo pela Justiça Federal. Cunha afirmou que o
procurador-geral Janot “obrigou Camargo a mentir”.
Os delatores acusam Cunha de intimidação. Dizem ter medo
dele. Não são os únicos. A figura messiânica, as manobras polêmicas e as
posições extremamente conservadoras de Cunha mostram a face pior do PMDB. Até
recentemente, Cunha era fã da delação premiada e da Lava Jato. Agora, diz que o
Executivo usa a operação “para constranger o Legislativo”.
A tropa de choque do PMDB em torno de Cunha formou-se
rapidamente. “Essas coisas” atrapalham o país, “abalando a natural tranquilidade
que sempre permeou” o Brasil, disse o vice-presidente Michel Temer. Renan
Calheiros afirmou que o país passa por “uma crise institucional”. “Vivemos um
momento grave, preocupante”, porque o Brasil pode estar “ferindo de morte a
própria democracia”, disse o presidente do Senado.
É curioso. O Brasil, com certeza, tem outra opinião. A
democracia vive um momento de ouro porque não poupa ninguém. Não há lugar na
Politeia para Collor e uma cambada de homens públicos brasileiros. Nossa
República dos rabos presos precisa ser refundada e começo a crer nessa
possibilidade. Você compraria um Lamborghini usado de Collor, Cunha ou Renan?
18 de julho de 2015 | N° 18230
NÍLSON SOUZA
PÉS NA LAMA
Somos mesmo criaturas contraditórias.
Devíamos amar essa chuva que desabriga pessoas, inunda vilas
e cidades, umedece as roupas, as paredes e as almas dos vivos. Mas não. Ficamos
todos entristecidos pelas famílias expulsas de suas casas, com suas crianças
chorosas e seus animais de estimação. Também me comovo com isso. Mas a culpa não
é da chuva nem de São Pedro e tampouco dessa pobre gente que mora em áreas
suscetíveis de alagamentos, na maioria dos casos por não ter para onde ir. Fácil
demais, também, é responsabilizar as autoridades e os próprios cidadãos, pelo
mau hábito de lançar lixo em qualquer lugar, o que causa entupimento de esgotos
e o assoreamento dos rios.
Então, de quem é a responsabilidade?
Da natureza é que não é. Chove desde o início dos tempos e é
essa bênção que mantém a vida sobre o planeta. A chuva deveria ser sempre bem-vinda.
O problema somos nós, todos nós, não apenas os moradores de áreas de risco. Não
queremos mais sujar os pés. Isso mesmo, os alagamentos nas cidades – asseguram
geólogos e urbanistas – devem-se principalmente à impermeabilização de extensas
áreas.
É bom trafegar pelo asfalto, é ótimo caminhar em dia de chuva sem pisar
na lama, é confortável não ter que varrer as folhas de árvores dos pátios e das
calçadas. Mas o preço é este: quando a água chega, não tem como se infiltrar no
solo, não tem raízes que a conduzam ao interior da terra. Então, se acumula,
provoca deslizamentos, invade ruas, praças e casas. Não há sistema de drenagem
que dê conta.
Nossas cidades impermeáveis são um convite às inundações.
Nem é preciso chover durante quatro anos, onze meses e dois
dias, como ocorreu na emblemática Macondo de García Márquez. Basta uma semana
de tempo feio, como esta que está terminando, para todos amaldiçoarmos a
bendita chuva.
O papa Francisco, esse surpreendente argentino que conjuga
humildade e sabedoria, divulgou há poucos dias uma encíclica sobre o meio
ambiente e alertou para a iminência de guerras pela água. Se continuarmos a
consumi-la irresponsavelmente, em breve estaremos brigando por ela.
Concluo, pois, esta pregação no molhado com aquele provérbio
chinês que manda acender uma vela em vez de amaldiçoar a escuridão. Pise na
lama, mas bendiga a chuva.
18 de julho de 2015 | N° 18230
PALAVRA DE MÉDICO - J.J. CAMARGO
Os que não conseguem morrer
Que motivações tornam tão diferentes os indivíduos que
buscam felicidade pessoal?
Morrer, literalmente, é de um primarismo e de uma pobreza
que contrastam com a engenhosidade e a exuberância dos sonhos concebidos
naquela fase da vida em que fantasiamos ser o que provavelmente nunca seremos. Superada
essa etapa de projetos irrealizáveis e promessas falaciosas, os modelos da vida
real começam a se esboçar com diferentes perspectivas. E todos, de uma maneira
mais ou menos elaborada, tentam sublimar a rudeza da morte e seguir vivendo,
apesar da ameaça.
Excluída a legião tristemente majoritária dos que gastam a
vida tendo como único alvo a sobrevivência – e desses não se pode exigir mais
do que tristeza e resignação –, emergem dois grupos de pessoas mais equipadas
do ponto de vista intelectual e econômico, ou seja, aquelas que têm condições
de realmente planejar o que querem ser. Evidentemente, se vão conseguir ou não
dependerá de uma série imensa de fatores aleatórios, como inteligência,
iniciativa, perspicácia, ambição, oportunismo, coragem e, naturalmente, uma
pitada de sorte. Esses ingredientes que dão à vida o delicioso colorido do imponderável.
Mas não é dessas dificuldades e vicissitudes que quero me
ocupar. Pretendo, antes, rever as motivações que tornam tão diferentes os indivíduos
que, partindo do mesmo ponto de largada e com os mesmos equipamentos, escolhem
caminhos tão diversos na busca da realização e da felicidade pessoal.
Há os egocêntricos, que crescem enclausurados na autossuficiência,
constroem grandes fortunas, esmagam os concorrentes, odeiam qualquer Segundo
Caderno, esbanjam vaidades discutíveis, casam com mulheres bonitas e fúteis,
montam sofisticadas academias em casa e, ainda assim, engordam muito, morrem
antes da velhice e promovem velórios silenciosos, rodeados de amigos falsos e
parentes interesseiros. Alguns poucos, constrangidos pelo estigma do egoísmo,
fazem doações espalhafatosas e nem tentam disfarçar a expectativa de
reconhecimento. Mas, mesmo na homenagem, não conseguem dissimular a falta que
faz a espontaneidade. A avareza é uma tatuagem com tinta colorida,
dolorosamente irreversível. Para esse grupo, a morte é a única terapia eficaz,
compreensivelmente acelerada pelo esquecimento.
No contraponto, estão as criaturas especiais que nasceram
para outro tipo de façanha: a de modificar para melhor a vida dos outros. Alguns
desses até ganham dinheiro, não porque o perseguiram, mas como prêmio por sua
competência. Para esses tipos, não há espaço para ostentação, nem tolerância
com as mediocridades laureadas.
São modestos e austeros, detestam exibicionismo
e estão sempre inconformados por terem feito menos do que conceberam realizável.
Não se queixam de fracassos eventuais e até usam deles para se fortalecerem
ainda mais e esticar a corda do possível. São estoicos na doença e comovem seus
pares pela bravura e pela resiliência. Quando a morte física chega, parece que
não. Há tanto para relembrar e tantos projetos energizados pela contagiante
gana de viver, que eles serão perpetuados, pelo menos até que morra o último
felizardo agraciado pela ternura do convívio.
Li o obituário do Silvio Antonio Zanini com a leveza de quem
tinha convivido e testemunhado, pela vida afora, a doce passagem de um desses
tipos imortais. E, depois que chorei, senti vontade de melhorar.
terça-feira, 14 de julho de 2015
14 de julho de 2015 | N° 18226
CARPINEJAR
Aguente declarações de amor sem gracinhas
O sarcasmo destrói a sinceridade. Já fui vítima e já fui algoz.
O homem, principalmente, tem vergonha de se declarar e vive
se escondendo em brincadeiras. Tem vergonha de se emocionar e vive mascarando
com piadas os momentos próximos das lágrimas.
É perceber que vai chorar ou umedecer os olhos que ele
retira uma ironia do fundo de si para escapar ileso da entrega. Em vez de retribuir uma delicadeza ou entrar no clima
romântico, ele vem com uma grosseria para tentar descontrair.
Não faça mais isso, aprendi a não fazer. É tão difícil ser sincero, leva muito tempo para o outro
encontrar força para dizer algo importante, não banalize o encontro com a sua
desatenção.
É custoso formular o que talvez nunca tenha sido dito para
ninguém, não estrague com o deboche.
Sua namorada pode ter atravessado décadas naqueles minutos
para entender um sentimento e partilhar uma verdade.
Relembre seus amores platônicos e doloridos da infância:
quantas vezes procurou se declarar para uma menina, as frases subiram até a
boca e voltaram ao silêncio? Você deseja que sua companhia passe pelo mesmo
sofrimento?
Ninguém é covarde sozinho. Somos covardes porque nos deixam
sozinhos com as palavras, não somos ajudados a falar o que nos incomoda.
Apoie a coragem de sua namorada. Devemos economizar e preservar as confissões de amor.
Devemos valorizar e inspirar as confissões de amor. Temos que diferenciar a hora da ironia da hora de falar
sério.
Não desestimule a sinceridade com palhaçadas. Drama pede
meia-luz, mãos dadas e olhos nos olhos (o gênero comédia romântica é uma
mentira – é só romance, colocaram comédia no nome para forçar o namorado a ir
ao cinema).
Não dê motivos para que ela desconfie de seu compromisso – é
o que acontece quando reage superficialmente diante de conversas mais
profundas.
Fique quieto, parado, ouvindo, sei que você se enxergará
emparedado, encurralado, assustado com a queda repentina de testosterona no
corpo, pronto para abrir a porta do riso e sair correndo, mas segure a
respiração e suporte escutar que você é a pessoa mais importante de alguém, sem
baixar a cabeça, sem buscar refúgio no celular, sem nenhuma gracinha.
Serão juras que salvarão o relacionamento quando estiver em
crise.
sábado, 11 de julho de 2015
12 de julho de 2015 | N° 18224
CARPINEJAR
Casal brigando esquece que tem filho
Quando estou numa discussão de relacionamento ainda me pego
guri, ainda me pego distraído. A mulher me pergunta algo simples e objetivo
berrando e me perco no ponto de interrogação, somente presto atenção no agudo
de seu timbre.
Ela questiona sim ou não, e rastejo indeciso num estado
meditativo.
Com uma caneta nas mãos, faço de conta que não é comigo. Já
me flagro tirando o canudo, reparando o estado da tinta, me desligo
completamente das palavras. Diante da voz levantada, as palavras não são mais
comigo, sou inteiro do silêncio.
É um estado de fuga que guardei da infância, no momento em
que meus pais brigavam aos gritos. O palco permanece montado em minha memória:
arrumados na sala, eu e os irmãos brincávamos de forte-apache enquanto
esperávamos para almoçar.
Tudo ia bem, os cabelos estavam penteados e a mesa posta. De
repente, a porta da frente batia, os lustres balançavam e a paz ia embora. Alguém
saía de casa correndo, talvez o pai, talvez a mãe, e um seguia o outro.
A discrição não frequentava o nosso endereço, envolvia
perseguição de carros, latidos desesperados no quintal, abraços histéricos e
empurrões confusos.
Descobria que não teria almoço, nem sessão da tarde, muito
menos tranquilidade.
A briga dava dois trabalhos: o de explicar aos vizinhos
durante toda a semana o que aconteceu e o de acalmar o coração que nunca sabia
ao certo o que estava acontecendo.
Eu me abstraía de propósito, recusando determinar se
correspondia ao fim do casamento ou uma reiterada tentativa do papai e da mamãe
de se entenderem e de serem felizes.
Os filhos desapareciam naquele instante para os pais, eles
realmente esqueciam que eram pais. Casal quando briga esquece que tem filhos.
Alheios ao que escutávamos e à nossa posição vulnerável no
front de batalha, retornavam para a sala, jogavam objetos nas paredes, soltavam
palavrões que jamais poderíamos repetir e se xingavam mutuamente, com energia e
disposição demoníacas.
Eu mexia cada vez mais no cocar de meu índio do forte-apache
e em sua machadinha marrom. Fingia que não existia, diminuindo de tamanho, até
me transformar num boneco e alguém me guardar na caixinha para brincar no dia
seguinte.
Fixo na caneta e vejo que não me defendo do medo de gritos,
apesar de adulto, apesar da paternidade.
Em vez de escrever qualquer coisa de útil, em vez de pedir
socorro, vou desmontando a caneta no meio de uma nova e inesperada gritaria
doméstica.
12 de julho de 2015 | N° 18224
MARTHA MEDEIROS
Inquietude pré-embarque
A cada vez que estou fechando a porta de casa para ir ao
aeroporto, dou uma espiada mais demorada para a sala e penso: será que
voltarei?
Julho, mês de férias. Momento de se preparar para a melhor
coisa do mundo: viajar.
Na verdade, as três melhores coisas do mundo são comer,
dormir e transar (coloquei em ordem alfabética, não em ordem de preferência),
mas é viajando que desfrutamos para valer desses três grandes prazeres da vida.
Não há rotina, não há horários, ninguém está nos apressando. O que pode ser
mais excitante?
Pois estava, dias desses, conversando com quatro mulheres
que vivem em trânsito pelo mundo. Ainda que sejam contumazes viajantes, elas
admitiram que, a cada vez que compram uma passagem, sentem um temor incômodo
que não sabem de onde vem. Estranho, tendo elas tantas milhagens acumuladas,
mas não me surpreendeu. Também fico meio aflita antes de embarcar para um
destino longe demais do meu quintal. Por um motivo tosco, infantil: fico
achando que vou morrer.
Uma amiga que mora no Rio tem esta mesma sensação. Já somos
seis (as quatro mulheres da primeira conversa, minha amiga carioca e eu). Você
também? Então está na hora de a gente formar um grupo de apoio e tentar
entender o que acontece.
Não é um medo racional, um medo de que o avião caia, por
exemplo. As chances de ele cair são mínimas. Neste exato instante há várias
centenas de aviões cruzando os céus do planeta e nenhum deles estará na matéria
de abertura do Fantástico neste domingo (uma madeira, pelo amor de Deus! – toc,
toc, toc).
Trata-se de um desassossego, mais do que um medo. Viajar é
abrir um parêntese na vida, escapar de um esquema já organizado, se predispor
ao desconhecido – e se despedir de quem fica. A cada vez que estou fechando a
porta de casa para ir ao aeroporto, dou uma espiada mais demorada para a sala e
penso: será que voltarei? Nem preciso dizer o que sinto ao dar um beijo nos
familiares e trocar mensagens com os amigos: por um fiapo de segundo me passa
pela cabeça que é a última vez que estou falando com eles. Qual a razão dessa
neura descabida, se algo tão maravilhoso está para acontecer?
Deve ser justamente isso. Dá a impressão de que não
merecemos este algo tão maravilhoso, de que teremos que pagar por este extremo
deleite, não em cash, mas em sofrimento.
Culpa, em outras palavras.
Já soube de gente que, ao chegar ao aeroporto, mudou de
planos: deu meia-volta e retornou para casa. Ufa, me sinto menos louca diante
desses casos perdidos. Eu embarco com inquietação e tudo, e assim que o avião
aterrissa do outro lado, estou uma tonelada mais leve e completamente esquecida
do que até então me perturbava. A inquietação se autoextravia.
Aliás, embarco hoje e volto para a coluna daqui a duas
semanas. Sem despedidas, por favor.
sábado, 4 de julho de 2015
05 de julho de 2015 | N° 18215
CARPINEJAR
Invasores
– Já que ele não vai ficar comigo, não vai ficar com mais
ninguém.
Assim também esquece que ele jamais olhará novamente para
sua cara. Tentar destruir a próxima relação de seu ex ou flerte postando
mensagens ofensivas e insinuações na web ou até mesmo mandando prints de
conversas antigas é atitude de recalcada. Desceu sem volta o seu espírito para
o inferno mais remoto. Não há depois como salvar o respeito e a reputação. É
gesto de megera, de bruxa, de burra, de psicopata, onde os fins justificam os
meios.
Pode estar desesperada, louca, histérica, mas até o jogo da
sedução é constituído de regras e etiqueta, não é um vale-tudo emocional, o que
não é reciproco deixa de vigorar como realidade, cabe respeitar a decisão de
sua companhia, mesmo que um dia tenha recebido juras. Nada de destituir a
liberdade do outro, que tem todo o direito de reavaliar o trajeto, não querer o
relacionamento e trocar de opinião. Nada de bancar a hacker e entrar em contas
alheias em nome de uma dor-de-cotovelo.
Depois de perder o amor, é muito fácil perder o amor próprio
e despencar para a grosseria.
Não é não, o não está a léguas de significar um charme, não
é para insistir se não existe abertura, não é uma provocação, um desafio e uma
oportunidade para provar o seu valor.
Se ele não quer ficar junto, não se rebaixe e, o mais grave,
não busque rebaixar todo mundo. Não arraste inocentes para seu túmulo. Se está
infeliz, não espalhe a infelicidade. Aceite a derrota e o fracasso com
humildade. Não procure sofrer acompanhando a novela do amor recente nas redes
sociais. Não fique investigando o perfil da nova namorada. Não faça comparações
e conclusões distorcidas, não crie tumulto e fakes. Policial amador é
criminoso.
Ele não quis permanecer a seu lado quando apresentou seu
melhor, não é com o pior que mudará seu conceito. Compreensão e respeito são
capazes de trazer alguém de volta, jamais mentira e invasão de privacidade.
Isso serve para homens e mulheres.
Não provoque o desprezo. O desprezo é a paixão azedando,
vinho virando vinagre, sem rótulo e safra para ser lembrado. Quando o
sentimento acaba por uma das partes, é necessário ser amigo do tempo. O tempo
cordial é a única esperança que resta.
05 de julho de 2015 | N° 18215
MARTHA MEDEIROS
SUTIÃS
Um sutiã pode ter um significado oculto. Funcionar como um
abraço apertado. Uma amarração.
Minha profissão traz poucas inconveniências e muitos
prazeres, o que torna o saldo altamente positivo. Uma das coisas a celebrar é o
contato que tenho com pessoas que, mesmo desconhecidas, estabelecem comigo uma
intimidade enriquecedora. Foi o caso de uma garota (acho que ainda posso chamar
uma socióloga de 45 anos de garota) com quem tive uma adorável conversa dias
atrás, no Rio de Janeiro.
Ela me contou sobre seu primeiro casamento e sua primeira
separação, do quanto ficou abalada, de como fez para se reerguer, de como foi o
processo todo. Fez um relato comovente de tudo o que aconteceu, mas não pude
deixar de ajustar o foco num detalhe rápido que ela mencionou, daqueles que a
gente costuma deixar passar batido. Em meio ao turbilhão de emoções que ela
narrava, me disse: Depois do fim, eu já nem sabia direito quem era, nunca usei
sutiã e de repente comecei a usar.
Encontramos metáforas onde menos se espera.
Separação: tem desamparo maior? Uma aposta que parecia estar
dando certo de repente começa a fazer água, alguém que para você era a pessoa
mais importante do mundo perde o protagonismo, a vida estruturada se dissolve,
o amor dá lugar à mágoa, e mesmo quando não há mágoa ainda assim existe um
abismo para se atravessar antes de chegar ao outro lado. Você precisa
reconstruir sua identidade, não é mais a esposa de, o marido de, o amor da vida
de alguém.
As declarações não se sustentaram, as promessas não
vingaram, o destino foi mais forte que a idealização: fez cada um seguir
carreira solo. Depois de tanta luta, tanta negociação, tantas tentativas de
manter o acordo, chega a hora em que é preciso entregar os pontos, não há mais
o que fazer a não ser partir e tentar de novo com outro alguém, quando as forças
voltarem.
Mas, até que elas voltem, quanto medo. Da solidão, da
saudade, do rumo desconhecido. Você agora é um, não dois. Já não tem quem
segure sua mão. Está solto. E essa soltura assusta. E se eu cair?
Um sutiã pode ter um significado oculto. Funcionar como um
abraço apertado. Uma amarração. Não usá-lo sempre foi uma atitude libertária,
até que, um belo dia, você descobre que a liberdade virou um bicho-papão e você
voltou a ser uma menininha assustada. O que mais deseja é se sentir presa,
segura, acolhida.
O desafio das separações é fazer com que voltemos a nos
sentir confortáveis com a soltura dos dias, confortáveis diante da incógnita do
futuro. Não sei no que os homens se seguram quando se separam (minto: sei, sim),
mas grande parte das mulheres recomeça a vida emocional se segurando nelas
mesmas. Só então, aos poucos, iniciam outra revolução, uma nova queima de sutiãs,
a fim de formar uma identidade mais firme que a anterior.
quarta-feira, 1 de julho de 2015
ESTAMOS NA BUSCA. . .
INCESSANTE DE SER.
INCESSANTE DE SER.
CADA UM COM SEUS PROPÓSITOS SERIAM ESTEPE DO BEM
VIVER.
QUE FAÇAM SUAS APOSTAS SE FOR POR MERECER QUE MEREÇA.
CHEGAMOS NUS E VIVEMOS NOS COBRINDO.
NESSAS CONCORDÂNCIAS ACABAMOS PARTINDO VESTIDOS.
NA DURA VERDADE VOLTAMOS COMO CHEGAMOS NADA NO BOLSO
E NAS MÃOS CARREGAMOS APENAS VIVÊNCIAS QUE AQUI
GANHAMOS.
OS SENTIMENTOS SERÃO NOSSO PASSAPORTE PORQUE É O
ÚNICO
DOCUMENTO QUE LEVAREMOS UMA VEZ RADICADO JAMAIS
DESFEITO.
E NOSSO TEMPLO CORPO ABRIGO DO ESPIRITO NOS SERVIU
TANTO
NOS COMBATES ALEGRIAS E PRAZERES FICARÁ AQUI NO
PLANO.
POIS O CORPO PERTENCE AO MUNDO SERVIU APENAS
DE VESTIMENTA E DEIXAMOS AQUI NO CHÃO TERRA.
GRATOS SEREMOS ETERNAMENTE POR ESSA VESTIMENTA.
NOS ABRIGOU PROTEGEU E AMPAROU.
QUE A SAÚDE NOS BRINDE DANDO MAIS ANOS DE VIDA.
MESMO COM DORES E MAZELAS É TÃO BOM FICAR AQUI.
A VIDA É BELA E ENCANTADORA SEJAMOS GRATOS.
VIVENDO TODAS AS BELEZAS ANTES QUE A NOITE CAIA.
ENQUANTO NÃO CHEGA VAMOS USUFRUIR DA
LUZ.
ATÉ O SONO CHEGAR ESTAREMOS ACESOS
PARA O QUE DER E VIER.
SOL HOLME
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