sábado, 4 de novembro de 2023


04 DE NOVEMBRO DE 2023
MONJA COEN

espiritualidade. Impermanência

Nada fixo. Quando percebemos que nada é permanente, podemos nos libertar e encontrar o caminho do despertar.

Despertar não é estar alegre o tempo todo. É saber que nem mesmo o que consideramos ser, o chamado "eu", é fixo ou permanente. Somos processos em transformação. O que éramos há 10 anos e o que seremos em outros 10? Nunca os mesmos.

Somos feitos de duas gotas - uma vermelha e outra branca. A mãe e o pai - o óvulo e o espermatozoide. Quando se interpenetram, inicia-se o processo de uma vida humana. Um processo incessante e fluido.

"Não nascemos prontos.", insiste o professor Mario Sergio Cortella. Como é verdadeiro! Estamos sempre aprendendo, reaprendendo, nos modificando. Estamos nos aperfeiçoando - tanto para o bem como para o mal.

Quando assisto na TV às atrocidades do Hamas, fico pensando em como esses jovens foram estimulados ao crime, à falta de sensibilidade, à maldade. Definitivamente não nasceram assim. Mas foram estimulados, talvez desde antes do nascer.

Dona Zilda Arns, médica católica que criou o soro doméstico e com isso evitou e evita que milhares de crianças morressem ou morram desidratadas, costumava dizer que "a violência começa no útero materno". Quão verdadeiro! Mães japonesas, ao saber que o que liam, faziam, influenciava o feto em gestação, passaram a estudar matemática - por exemplo, para que seu filho ou filha já nascesse com alguma capacidade.

Ora, mães que vivem em comunidades violentas, que recebem maus tratos e abusos, e com eles se acostumam e consideram "naturais", certamente estão estimulando seus fetos ao desamor e desamparo. Quando pequeninos são estimulados a tirar as perninhas das formigas, jogar sal no rabo dos passarinhos e usar estilingues para furar os olhos de seus desamores... Tudo isso sendo estimulado pelos adultos e coleguinhas.

Pode haver tendência, mas sem estímulo não se desenvolve. Por que passar de uma geração a outra o ódio, o rancor, a violência? Por que não podemos estimular o afeto, o compartilhar, o compreender?

Certa vez conheci um pajé, chamado Tchijo, do norte do Brasil. Perguntamos por que ele estava em São Paulo e não em sua tribo. Ele respondeu: "Temos dois pajés. Um fica na tribo. Eu considero o mundo todo minha tribo e viajo para que todos assim percebam".

Então perguntamos sobre os maus tratos que receberam dos portugueses, se ele não ensinava a seus filhos e netos a ter cuidado com os brancos. "De jeito nenhum", retrucou. "História do passado. Nunca se deve manter o rancor, a raiva, o mal aceso."

Que bonito! Quando criança gostava de me sentar no colo de minha mãe. Ela gostava de ler e estudar.

Muitas vezes me pedia para ler trechos que a interessavam em livros de antropologia, história, geografia, psicologia, pedagogia. Lembro-me de uma frase repetida em alguns de seus livros de estudo: Rousseau dizia que o homem é bom e que a sociedade o corrompe. Outro, chamado Lombroso, descrevia o assassino nato. Ou seja, o assassino já nascia assassino e não era a sociedade que o corromperia. Será?

Vale a pena refletir sobre o assunto. Podemos nascer com certas tendências - se forem estimuladas, podem se tornar hábitos. Se não forem estimuladas podem atrofiar. O que estamos estimulando em nós e no mundo?

Mãos em prece

MONJA COEN

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