sexta-feira, 5 de agosto de 2022


05 DE AGOSTO DE 2022
CARPINEJAR

Mulheres faca na bota

Mulheres porto-alegrenses são faca na bota. Exigentes. Autônomas. Independentes. Não vão trocar a sua solitude por qualquer parceiro - ele, no mínimo, tem que ser melhor do que os prazeres individuais, ou ser capaz de não estragar o silêncio e a saudade.

Elas não vão substituir os amigos, os passeios sem dar satisfação, as viagens repentinas, o cálice de vinho, a maratona de séries, o espaço livre e o tempo soberano por um relacionamento pela metade, meia-boca, capenga.

Elas não vão ficar no casamento por comodismo. Não vão aceitar baixar os seus pré-requisitos por aparência, por desespero, para satisfazer a família ou a sociedade, para dizer que no final de semana têm uma companhia para chamar de sua enquanto toleram uma presença simbólica e fantasma durante a semana, que serve apenas para matar baratas e abrir potes de conservas.

O custo-benefício precisa valer a pena. Precisa valer sair da dieta, com a base da amizade, o recheio da cumplicidade e a cobertura da admiração, acrescidos do açúcar das gargalhadas e dos fios de ovos da paz de espírito.

Elas não querem ser babás ou uma segunda mãe de marmanjos, escolhendo por eles o que comer, o que vestir, o que fazer. Já chega ter criado os filhos.

Não gostam de desperdiçar madrugadas em discussões de relacionamento ou com manifestações de ciúme, como nas caricaturas românticas. A possessividade não interessa, o apego não é confiável; só trazem efeitos colaterais, adoecendo a convivência com controle e manipulação.

Não estão interessadas em combos, promoções, estepes, remendos nas estradas. Sequer exigem uma retaguarda financeira ou Caio Castro que pague a conta do restaurante. Mantêm os seus empregos, os seus orçamentos, os seus investimentos.

Nem sou eu que estou polemizando. São dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) referentes a 2021. Das 168 mil unidades residenciais ocupadas por um único morador em Porto Alegre, 96 mil são habitadas por mulheres. Correspondem a 57%, uma eleição ganha no primeiro turno.

Se abarcarmos a Região Metropolitana, o índice se conserva majoritário, com 53% - das 353 mil unidades residenciais, 188 mil são da ala feminina. É a capital brasileira com a maior proporção de mulheres morando sozinhas.

Os homens daqui, por sua vez, logo emendam relações. Não suportam a solteirice, ou o luto, ou a separação, ou as quatro paredes. Demonstram uma necessidade de estar sempre com alguém, em completa simbiose. Tanto é que 75% dos domicílios do universo masculino são com mais pessoas.

Já as porto-alegrenses ostentam um maior amor-próprio. Aprenderam com o divórcio a não cometer o erro duas vezes. É uma estatística da qual devemos nos orgulhar. Ainda espero que seja esculpida uma Laçadora no pórtico da cidade. Quem está segurando a corda de couro são elas.

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