sábado, 10 de abril de 2021


10 DE ABRIL DE 2021
FLÁVIO TAVARES

DELÍRIO GERAL?

O delírio é como a água: toma a forma do recipiente e pode ter leito e rumo, como num rio, ou dispersar-se, como no chuveiro. O delírio vê sem enxergar, não distingue cores nem tons, toma o absurdo como algo natural, engana-se a si próprio e é daninho quando vem dos altos escalões.

Dias atrás, em Chapecó (SC), o presidente da República voltou a portar-se como charlatão e insistiu no uso de cloroquina e outras quinquilharias comprovadamente maléficas no combate à covid-19. Para defender o que a ciência médica desaprova, disse que na Guerra do Pacífico, quando faltou plasma, "usaram água de coco em transfusões" e "salvaram vidas".

Bolsonaro trocou alhos por bugalhos. Água de coco é material neutro e foi injetado na veia em vez de soro fisiológico, não como plasma sanguíneo.

É inexplicável que Bolsonaro use a autoridade do cargo para insistir no uso de medicamentos que prejudicam (ou levam à morte) quando aplicados. Fazer isto em nome da "função do médico para salvar vidas" é um absurdo que beira o crime.

Tempos atrás, era delirante ouvi-lo dizer que preferia ter um filho morto do que sabê-lo homossexual. Ou proclamar que "o erro" da ditadura "foi não ter matado 30 mil brasileiros".

Agora, o delírio chegou ao Supremo Tribunal nos debates sobre a proibição de assistir a missas e cultos religiosos durante a pandemia. Com o aval de Bolsonaro, o procurador-geral da República e o advogado-geral da União creem que a proibição "fere a liberdade religiosa", quando - em verdade - busca evitar o contágio. Ou seja, é parte do necessário isolamento social.

O procurador e o ministro-chefe da AGU desconhecem que a fé religiosa é o contato direto de cada um com a divindade e não precisa de intermediação. Orar e ser piedoso é ato pessoal e, assim, proibir frequentar templos durante a pandemia nem sequer arranha a liberdade religiosa.

Ou esse tacanho argumento é uma forma de proteger as chamadas "igrejas pentecostais" que se dedicam, mais do que tudo, a arrecadar dinheiro, como se Deus cobrasse "royalties"?

As grandes crises geram, também, lucidez e união da sociedade civil. Na última semana, 280 grandes empresas, bancos e instituições que reúnem ambientalistas e o agronegócio pediram que o presidente da República seja mais estrito na defesa do clima e do meio ambiente.

O Brasil é o sexto maior causador mundial do "efeito estufa", mas o governo alega que só poderá agir se receber bilhões de dólares em doações estrangeiras? É delirante!

 Jornalista e escritor - FLÁVIO TAVARES

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