sábado, 4 de junho de 2022


04 DE JUNHO DE 2022
CLAUDIA TAJES

Troféu Imprensa

Imagine um mundo sem jornais. Sem um espaço confiável para procurar uma informação. Um mundo onde as pessoas repassassem as coisas no boca a boca - e quem conta um conto, aumenta um ponto, diz a sempre sábia sabedoria popular. Existe uma Janete Clair dentro de cada um de nós, uma novelista enrustida acrescentando complicações imaginativas ao que parece prosaico demais. Nota para as novas gerações: Janete Clair foi a primeira-dama da telenovela no Brasil, até hoje inspiração para autores do ramo.

Maria e João casaram ontem. O vestido dela, credo, era de um mau gosto atroz, todo transparente, não era figurino para se entrar na igreja. E ele, que deixou uma namorada grávida para trás? A madrasta da noiva ficou no altar ao lado do marido, toda carinhosa, mas só para disfarçar. Faz anos que ela tem um caso com a Alzira, a madrinha da Maria, que nem convidada para o casamento foi.

De alguma forma, desde que uns e outros se dedicaram a demonizar a imprensa, a gente tem visto histórias assim, tão maldosas quanto ridículas, espalhadas pelo meio preferido de (des)informação dos que compraram a ideia de que a imprensa nunca diz a verdade. Por que ler um jornal se o grupo de WhatsApp traz tudo bem mastigadinho, e com detalhes que ninguém mais conhece?

A cantora fez uma tatuagem naquele lugar porque é satanista, a favor do aborto, drogada, pró-pedofilia e dança Macarena pelada. Passe adiante sem dó, nem piedade.

Saudade do tempo em que o grupo da família era apenas o órgão oficial do tradicional bom dia com a imagem de um sol nascendo ou de uma flor se abrindo. Hoje, mamadeira de piroca é pinto, sem trocadilhos, perto do que se lê ali.

Já se aventou que os responsáveis pela desinformação que corre solta no WhatsApp são os próprios jornais, que começaram a cobrar pelo conteúdo da internet e deixaram os não-assinantes à mercê dos mentirosos profissionais. Pode até ser, mas bom-senso não é exclusividade de assinante. Cada vez que um absurdo é repassado, fica a dúvida: quem encaminhou é ingênuo ou mal-intencionado? Pessoalmente, voto na segunda hipótese.

A vida sempre vem em versões pouco verossímeis no WhatsApp. Nem vamos falar no que aconteceu no início da pandemia, ou nos esculachos que comprometeram - e comprometem - carreiras e reputações. Nas versões covardes para o assassinato de Gevanildo, em Sergipe, e para as operações policiais que matam também quem não tem nada a ver com o peixe. Conselho de amiga: ao receber uma suposta notícia pelo WhatsApp, perca alguns minutos checando nos jornais. Evita disseminação de lorotas e poupa a gente de passar vergonha.

Tudo isso porque 1º de junho foi o Dia da Imprensa, que é uma das grandes ferramentas da democracia. Repetindo o óbvio: sem imprensa não existe democracia. Quem está distante da rotina de redações, plantões e apurações talvez não imagine o quanto os jornalistas trabalham pela notícia. Quem se apaixonar por uma ou um, já vá sabendo que dias santos e feriados serão dias trabalhados. E o salário, ó, como dizia o professor Raimundo.

Aproveitando o Dia da Imprensa, mando aqui minha mais sincera admiração por todos os jornalistas e um beijo (atrasado, para variar) para as minhas editoras, Renata, Mary e Adriana, que seguram as pontas das minhas tardanças na entrega da página. Na semana que vem, a coluna vai chegar no prazo - juro que não é fake news. E para a família, os amigos e os leitores do David Coimbra, um abraço com a certeza de que ele continua em cada linha que deixou.

CLAUDIA TAJES

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