O PAPA E AS MULHERES
É inegável a influência da igreja católica, ou do cristianismo, ao longo dos séculos. Pelo menos no mundo ocidental, até o calendário foi obra de um papa. Em 1582, Gregório XIII instituiu o atual calendário através de um simples decreto papal, corrigindo os equívocos da velha contagem dos dias, meses e anos.
Agora, em 2024, o novo ano começou com uma surpresa quando, segundo os vaticanistas, o papa Francisco deu o passo inicial para que as mulheres possam incorporar-se ao sacerdócio no futuro. Até aqui, no catolicismo, as mulheres podem apenas desempenhar funções caridosas, tal qual nas escolas e nos hospitais, como professoras, enfermeiras ou administradoras.
Neste início de 2024, porém, Francisco repeliu com veemência inusitada qualquer tipo de violência contra as mulheres, enfatizando que o feminicídio é um pecado que vai além do assassinato em si. Em discurso no Vaticano, apenas 10 dias após a proclamação da Fiducia Supplicans, que deu aos sacerdotes o direito de abençoar casais homossexuais ou irregulares (quando um ou ambos os cônjuges sejam divorciados), a declaração do Papa foi inovadora e revolucionária.
A nova interpretação do papel da mulher - tanto na igreja quanto no cotidiano - lembra o aggiornamento (ou a inserção da igreja nos acontecimentos do dia a dia) implantado por João XXIII e continuado pelo sucessor Paulo VI. De fato, o papa Francisco já havia indicado seus futuros passos no último sínodo dos bispos, ao permitir que os leigos votassem e as mulheres tivessem voz.
A posição papal sobre o feminicídio é só um dos aspectos que, nos últimos cem anos, reintegraram a mulher na vida social e política. Em nosso país, o voto feminino foi implantado só após a Revolução de 1930, que levou Getúlio Vargas ao poder. Na maioria das nações da culta Europa, as mulheres só passaram a votar anos depois do Brasil. Aqui, porém, o antigo código civil estabelecia que "o homem é o cabeça do casal", relegando a mulher a um plano inferior, sem capacidade para decidir.
De qualquer forma, ainda que nada tivesse acrescentado sobre o feminicídio, Francisco torna-se um papa inovador num outro aggiornamento ou renovação. Seu ideário não foi abalado nem mesmo com os problemas de saúde que se agravaram nos últimos tempos de seu pontificado de 10 anos.
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