sábado, 14 de junho de 2025


É o fim dos aiatolás?

A mira inicial dos ataques de Israel foram centrais nucleares, bases aéreas e de lançamentos de mísseis, cientistas e comandantes militares, mas o alvo final, que os aiatolás não se iludam, é a longeva ditadura dos turbantes.

Poucas vezes na história se viu uma ofensiva tão longa e detalhadamente planejada. Há pelo menos 20 anos, Israel perscruta seu maior inimigo com a convicção de que não era uma questão de se, mas quando ia bombardear os centros nucleares. Com a experiência de escaramuças anteriores, Israel sabe que as pancadas pregressas no programa atômico de Teerã, da eliminação de cientistas à difusão de vírus nos computadores iranianos, apenas retardam por meses ou alguns anos o desenvolvimento de artefatos nucleares com o selo dos aiatolás. A ameaça de um cogumelo atômico se erguer sobre Tel-Aviv só desaparecerá com o real compromisso do Irã de abdicar do enriquecimento de urânio ou o fim do regime.

Na véspera do ataque, a Agência Internacional de Energia Atômica da ONU denunciou o Irã, e a resposta de Teerã foi anunciar reforços no desenvolvimento nuclear. A coincidência foi mais uma peça a se encaixar no quebra-cabeça de oportunidades únicas que se abriram para Israel definir o momento de atacar. Em primeiro lugar, os braços longos do Irã na região - Hamas em Gaza, Hezbollah no Líbano e Houthis no Iêmen - foram dizimados ou são incapazes de reagir. A Síria de Assad deu lugar a um regime que não quer confusão agora, a Rússia de Putin está entretida com suas próprias humilhações e a capacidade de resposta do Irã foi fragilizada pelos ataques contra radares e lançadores de mísseis em outubro passado.

A reação burocrática do mundo islâmico e de outros países contra a ação israelense também evidencia que ninguém se mostra disposto a socorrer os aiatolás. No fundo, tudo o que os vizinhos do Irã não desejam - como de resto qualquer governo com o mínimo de sanidade - é deixar um botão nuclear nas mãos de fanáticos religiosos com ambições de expansão imperialista.

Ditaduras resistem a muita coisa - e conflitos bélicos são bons para unir a população e silenciar a oposição num primeiro momento. Mas, como mostram a Argentina das Malvinas e o Iraque de Saddam Hussein, nem o mais sanguinário regime resiste a uma humilhação militar. A desenvoltura, e a eficácia, do serviço secreto israelense sob as barbas do líder Ali Khamenei é de fazer corar aiatolá de pedra. Um levante no Irã, contudo, não ocorre com o país sob ataque. Se os aiatolás sobreviverem, restabelecerão o programa nuclear sem amarras e sob proteção redobrada contra ameaças externas. Esse é o maior risco da ação israelense. A sorte está lançada, e não tem mais como voltar atrás. 

MARCELO RECH

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