quarta-feira, 4 de novembro de 2015



04 de novembro de 2015 | N° 18345 
MOISÉS MENDES

Capitalistas


Escrevi no domingo que os empresários estão vendo a banda passar, alheios às decisões políticas que os afetam, e de novo recebi e-mails que me enquadram como anticapitalista e comunista. Não sou anticapitalista e nunca fui e nunca serei comunista, porque não tenho mais idade nem preparo físico.

Ser comunista, disse Picasso, exige muito mais do que ser fascista. O fascista não precisa pensar muito e não tem nenhum compromisso com a reflexão mais complexa. Com a internet, menos ainda.

Mas convivi com alguns colegas comunistas. O grande João Aveline foi o jornalista mais comunista que conheci. Trabalhou aqui na Zero até depois dos 70 anos. Vinha à minha mesa na Editoria de Economia e fazia sempre a mesma provocação: e aí, seu liberal de meia-tigela.

Pois em 1988, como jornalista de Economia, entrevistei um jovem de 37 anos que começava a brilhar no Estado. Comandava as redes de lojas Modacasa e Eletro Shop. Entrevistei José Galló durante quase uma hora, na loja da Ipiranga, numa época em que não havia quase mais nada por perto. Lembro do que ele me disse ao final: nunca concedi uma entrevista tão longa.

Naquele tempo, o comércio não abria aos domingos. Galló desafiou os sindicatos e abriu a Eletro Shop de Canoas num domingo. Na entrevista, ele defende a competição sem proteções e subsídios, exalta o lucro e diz: um dia, o comércio funcionará aos domingos.

Executivo há mais de duas décadas, Galló é o presidente das Lojas Renner. Virou a estrela do varejo aqui e no Exterior. Remoçou a marca e modernizou ambientes e processos das 264 lojas. É referência mundial de ousadia e criatividade. A Renner cresce sem parar, mesmo na crise.

Pois, na segunda-feira, o jornal O Estado de S. Paulo publicou uma entrevista com ele, que passo a usar como recibo contra os que me acusam de comunista. Galló diz que os líderes empresariais brasileiros, distantes do que se passa em Brasília, devem ser protagonistas e ajudar a destravar a economia. A crise é mais política do que econômica, diz Galló.

Naquele 1988, quando o entrevistei, o Brasil quebrado pediu um papagaio de US$ 1,5 bilhão ao FMI. A inflação foi de 1.037,56%. Mas não havia o que enfrentamos hoje – o brutal poder de destruição do que há de pior na política brasileira.

Essa é a melhor frase de Galló sobre a crise política: “Essa luta irresponsável está prejudicando o Brasil”. Ah, se tivéssemos menos chorões e mais capitalistas da estirpe de José Galló.

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