sábado, 10 de outubro de 2020


10 DE OUTUBRO DE 2020
FLAVIO TAVARES

PREFEITÁVEIS?

O título deste artigo não aparece nos dicionários, mas é real. Há uma enxurrada de pretendentes à prefeitura de Porto Alegre, imitando a chuva e o frio fora de época. A julgar, porém, pelo primeiro debate na TV, dias atrás, não há quem veja nem fareje os problemas da cidade.

As deficiências da vida urbana foram citadas só de passagem, como se os candidatos fossem turistas recém chegados, que conheceram apenas o pôr do sol no Guaíba. Nosso rio (ou lago) é a joia maior que coroa a cidade, mas sequer foi citado, como se fosse um trambolho incômodo.

Em apenas 10 ou 15 anos, o Guaíba estará sob ameaça de virar pestilenta massa líquida, se a pretendida mina de carvão a céu aberto, em terras de banhado à beira do Jacuí e a 12 quilômetros da Capital, for licenciada pela Fepam, mas nenhum dos "prefeitáveis" sequer pensou nisso. Dirão que "é atribuição do governo estadual" e, assim, lavam as mãos, como Pilatos.

O palavreado foi constante mas genérico e tolo, com meras intenções, nunca planos concretos. Essa pífia visão do que seja governar domina, hoje, os aglomerados que se autodenominam "partidos", num embuste ao que devia ser a função da política em democracia.

Sim, pois democracia não é só votar, mas penetrar a fundo nos problemas e apontar soluções para o futuro. A tragédia de Brumadinho (MG), onde a mineração matou gente e esterilizou rios e terras, não é modelo a seguir.

Mas não foi só isso que os "prefeitáveis" não viram no debate. Esqueceram-se, até, da pandemia. Não apontaram sequer os símbolos do descaso - os buracos das ruas e a voracidade dos "azuizinhos", que se limitam a multar sem ajudar no trânsito.

Sem ideias, os "prefeitáveis" se mostraram inigualáveis e isto, pelo menos, rima.

Tudo isto, porém, nada é, comparado à nova e lúcida encíclica do papa Francisco. Todos irmãos critica o egoísmo do neoliberalismo e apela a sepultar o individualismo da sociedade de consumo, que se guia só pelo lucro, nunca pela fraternidade solidária.

O Papa aponta a deformação e manipulação de conceitos como democracia, liberdade ou justiça, além da perda do sentido social e da consciência histórica como causas diretas do desastre atual, que a pandemia revela. Mas alertou que, após controlada a covid-19, persistirá o perigo de "cairmos num consumismo febril e em novas formas de egoísmo".

Sobre a responsabilidade social dos governos, o Papa lembrou que "ajudar os pobres com dinheiro é remédio provisório nas emergências. O objetivo deve ser consentir uma vida digna através do trabalho". E frisou: "Não há pobreza pior do que privar a dignidade do trabalho". 

Jornalista - FLÁVIO TAVARES

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