sábado, 14 de março de 2020


14 DE MARÇO DE 2020
RODRIGO CONSTANTINO

Cisne negro

Todos precisamos planejar, preparar-nos para o futuro, especular - do verbo em latim que quer dizer olhar à frente. Mas a dura realidade, que detestamos constatar, pois adoramos enxergar ordem num mundo um tanto caótico, é que o futuro é imprevisível. O risco está normalmente onde menos podemos enxergá-lo.

Fazemos previsões sobre guerras, economia, clima, escutamos os especialistas, mas eis que um maldito vírus surge numa cidade pobre chinesa e espalha pânico no mundo todo, impondo um custo pesado em termos de vidas perdidas e queda do crescimento econômico. É o cisne negro.

Nassim Taleb, famoso por popularizar a expressão em livro, faz um apelo por mais humildade, infelizmente algo em falta na maioria dos homens, que necessitam do conforto de previsões e, portanto, costumam ignorar os limites do nosso conhecimento. É um livro sobre a incerteza, sobre os raros eventos que mudam o rumo das coisas sem aviso prévio e sem que os modelos estatísticos, que olham para o retrovisor, possam antecipá-los.

A ideia central está relacionada à cegueira em relação ao fator aleatório das diferentes áreas da vida. Cada um pode observar sua própria história para verificar quanto os fatos ocorridos divergiram dos planos traçados anteriormente. A escolha da profissão, o encontro com a futura mulher, as mudanças repentinas nos rumos da vida, quanto cada uma dessas coisas havia sido corretamente prevista?

A lógica do "cisne negro" torna aquilo que não sabemos algo muito mais relevante do que aquilo que sabemos. Os "pontos fora da curva" ocorrem com muito mais frequência do que antecipamos, e nossa incapacidade de prevê-los é nossa incapacidade de prever o curso da História.

Devemos evitar a ilusão de compreensão, quando achamos que sabemos o que se passa num mundo que é bem mais complexo do que percebemos, e também a distorção retrospectiva, que transforma a História mais clara após os fatos, organizando-os de forma bem mais simplista do que a realidade.

O conhecimento humano tem evoluído bastante, e isso é maravilhoso. Mas se o resultado for a arrogância em relação ao futuro incerto, então seremos vítimas indefesas dos "cisnes negros" negativos, e também evitaremos muito avanço por conta do acaso.

RODRIGO CONSTANTINO

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