sábado, 11 de dezembro de 2021


11 DE DEZEMBRO DE 2021
DIÁRIOS DO MUNDO

No centro do boicote à China

Desde segunda-feira, quando os Estados Unidos anunciaram o boicote aos Jogos Olímpicos de Inverno, em Pequim, outros países, aliados americanos, vêm tomando a mesma decisão. Austrália, Reino Unido e Canadá também afirmaram que não irão enviar autoridades de governo ao evento - isso não impede, no entanto, que atletas dessas nações participem das competições. O boicote é, por enquanto, apenas "diplomático". Trata-se de um protesto contra as violações aos direitos humanos cometidas pelo regime chinês, comandado pelo Partido Comunista, contra os uigures, população que habita a província de Xinjiang, no noroeste do país.

Quem são os uigures?

São a etnia que habita há séculos a região autônoma de Xinjiang. Essa população, que segue a religião islâmica, é uma das 56 etnias reconhe­cidas pelo governo chinês (a predominante no país é a etnia han). Os uigures identificam-se culturalmente muito mais com os povos da Ásia Central (do Paquistão e do Afeganistão, por exemplo) do que com o resto da China. Os uigures chegaram a declarar independência. Mas o separatismo não avançou, e, em 1949, com a tomada do poder por Mao Tsé-tung, o governo de Pequim passou a controlar Xinjiang. 

Nos últimos anos, a região presenciou intensa migração de chineses da etnia han, e os uigures passaram a reclamar de discriminação. Relatórios de organizações independentes internacionais, que coletaram testemunhos de uigures, atestam que o tratamento do governo chinês a esse grupo constitui crime contra a humanidade, em razão de práticas para reduzir a taxa de natalidade de uigures, como esterilização forçada e aborto. Possivelmente mais de 1 milhão de uigures foram presos sem justa causa e levados a "campos de reeducação" para trabalhos forçados, que lembram os da Revolução Cultural empreendida por Mao. Relatos dão conta de tortura e abusos sexuais.

Os uigures reclamam de perseguição por falarem sua língua nativa (estreitamente relacionada ao uzbeque e semelhante aos idiomas cazaque, quirguiz e turco), manter sua cultura (mais ligada aos uzbeques e cazazes) e praticar sua religião, o Islã de vertente sunita. Grupos armados separatistas afirmam que a região não é legalmente parte da China e, por vezes, realizam atentados contra policiais e funcionários do governo de Pequim. Um desses grupos é chamado Movimento Islâmico do Turquestão Oriental, acusado pelo Partido Comunista de ter laços com organizações extremistas como Talibã e a rede Al-Qaeda.

O que é Xinjiang?

Xinjiang é uma região autônoma da China, como o Tibete. Sua capital é Urumqi, onde vivem 2,3 milhões de pessoas. Ao todo, na província, vivem 10 milhões de uigures. Xinjiang é rica em recursos naturais, e sua economia tem girado em torno da agricultura e do comércio. Suas cidades já foram pontos de parada ao longo da histórica Rota da Seda. Por ali, passam também importantes corredores do megaprojeto de infraestrutura da China atual, chamado Belt and Road Initiative, conhecido como a Nova Rota da Seda. A região ficou sob domínio chinês depois que a dinastia Quing assumiu o controle em uma campanha militar no século 18. Nos anos 1930 e 1940, duas repúblicas de curta duração reivindicaram independência, mas as áreas foram ocupadas pelo Partido Comunista quando Mao assumiu, em 1949.

O que diz o regime?

O governo acusa militantes uigures de realizarem campanha violenta pela independência de Xinjiang, com ataques a bomba e incitando a população à rebelião. Também acusa os grupos armados de terem recebido treinamento em campos de terroristas no Afeganistão - essa suspeita ganhou corpo depois dos atentados de 11 de setembro de 2001 nos EUA e das ações americanas na Ásia Central. A China ressalta que os "campos de reeducação" têm o objetivo de evitar o extremismo islâmico. O PCC monitora o trabalho de jornalistas internacionais na região, o que impede relatos independentes. Na terça-feira, a organização Repórteres Sem Fronteiras denunciou que mais de 70 jornalistas locais, de origem uigur, estão detidos. Em relação ao boicote americano, a China classificou o ato como "arrogância" e disse que se tratava de "provocação política direta".

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