sábado, 8 de janeiro de 2022


08 DE JANEIRO DE 2022
OPINIÃO DA RBS

PELA VERDADE, PELAS CRIANÇAS E PELA VIDA

No momento em que um tsunami de contágios de covid-19 e gripe atinge o país e na antevéspera do tardio início da vacinação de crianças entre cinco e 11 anos, uma nova manifestação do presidente da República provoca insegurança e indignação. Em entrevista à Rádio Nordeste, de Pernambuco, com grande repercussão nos demais meios de comunicação e nas redes sociais, o senhor Jair Bolsonaro afirmou que desconhece a incidência de óbitos de crianças por covid, lançou suspeitas sobre efeitos colaterais da imunização e sugeriu que os pais consultem o vizinho antes de vacinar seus filhos.

"Qual o interesse das pessoas taradas por vacina?" - questionou com veemência, como se a comunidade humana, os organismos internacionais de saúde, cientistas e profissionais especializados, a Anvisa e integrantes de seu próprio governo fizessem parte de uma conspiração planetária para espetar braços infantis.

É, realmente, doloroso ver meninos e meninas sendo submetidos ao breve sacrifício da injeção. Porém, dói muito mais - e essa dor não passa nunca - ver crianças com sequelas permanentes de doenças que podem ser prevenidas ou tendo suas vidas abreviadas por doenças que podem ser evitadas e remediadas. Segundo o próprio Ministério da Saúde do atual governo, mais de 300 brasileirinhos morreram de covid entre 2020 e 2021, informação que o presidente não tem o direito de desconhecer.

Além disso, a não ser que o vizinho seja uma autoridade em virologia, o mais sensato é perguntar ao médico da criança quando os pais têm quaisquer dúvidas sobre efeitos colaterais da imunização. Consultado recentemente por GZH sobre o assunto, o infectologista Marcelo Otsuka, integrante da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), relatou que em 7 milhões de doses aplicadas em crianças nos Estados Unidos ocorreram apenas oito casos de miocardite, que é um dos raros efeitos possíveis, todos com cura completa, sem necessidade de internação. Já no Brasil, de acordo com o médico e considerando a população pediátrica infectada pelo coronavírus, mais de 1,2 mil crianças tiveram a síndrome inflamatória multissistêmica (SIM-P) e 80 foram a óbito. Ou seja: a infecção é que causa efeitos colaterais danosos e, em muitos casos, letais.

Nesse contexto, o interesse das pessoas que defendem a vacina para adultos e crianças, talvez com a exceção de algumas poucas que só pensam em lucrar com o processo de imunização, é unicamente o de preservar vidas humanas de um flagelo já por demais prolongado. Decididamente, não é uma tara. É, isto sim, uma atitude de proteção às crianças que se soma ao respeito à ciência e à esperança de que a pandemia seja controlada o mais breve possível.

A verdade é que, apesar de mais uma inoportuna manifestação presidencial com potencial para confundir cidadãos menos informados, o Brasil está prestes a iniciar o processo de imunização do público infantil - um passo importante para a vitória definitiva sobre o vírus assassino e seus cúmplices negacionistas.

 

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