sábado, 11 de janeiro de 2020



11 DE JANEIRO DE 2020
FLÁVIO TAVARES

A AUSTRÁLIA AQUI

Os alérgicos foram os primeiros a constatar, antes ainda que a TV mostrasse as nuvens turvas da fumaça vindas lá da Austrália esparramando-se pelo Rio Grande. No atual mundo globalizado, fumaça já tem nacionalidade (só falta o "made in ?") e, agora, respiramos até ar importado.

Ou, à luz do sol, temos de aceitar o "ar importado", mesmo que seja como assaltante noturno entrando a nossas casas? Os incêndios na Austrália evidenciam algo que nossa ignorância não quer ver - todo ultraje à natureza, em qualquer lugar, se multiplica por si mesmo e afeta a cada um de nós no planeta.

As nuvens negras da fumaça australiana voaram pelo Oceano Pacífico e, agora, pairam sobre nós. A milhares de metros de altitude, hoje, o efeito nocivo é pequeno, mas existe como dano permanente. Ninguém pode impedir este invasor e nos limitamos a constatar a invasão. Na Argentina, em Córdoba e Rosario, perto da nossa fronteira, a "fumaça australiana" é visível a olho nu.

Esse desastrado presente de ano novo deve ser aproveitado pela lição que nos deixa e que alguns não querem enxergar. Os desastres nos obrigam a descobrir causas e efeitos, evitando que se reproduzam como coelhos em jaula. Nos incêndios da Amazônia, a fumaça chegou a São Paulo e seguimos inertes ante o significado disto no perigo maior - a crise do aquecimento global.

A "fumaça australiana" que a TV exibiu é a mostra concreta de como o aquecimento se propaga rápido como peste. É exemplo concreto daquilo que a ONU adverte com base em pesquisas científicas - nosso desdém pela natureza faz com que 1 milhão de espécies de animais e plantas corram risco de extinção, hoje. Na Austrália, uma reserva de cangurus foi destruída, matando 100 mil desses animais típicos do país. Aqui, nunca soubemos o que os grileiros arrasaram na Amazônia.

Cerramos os olhos à realidade, sem perceber que temos de escolher entre esperança e desdém para que a vida prossiga no planeta.

Agora, por exemplo, na crise entre EUA e Irã (desencadeada pela belicosidade de Trump), as pessoas comuns e a imprensa se preocupam pelo preço do petróleo mais, até, do que pela devastação de uma guerra mundial.

A bomba de gasolina supera a bomba nuclear?

Adoramos pequenezes. Os sujos e superados combustíveis fósseis, como carvão e petróleo, viraram falsos deuses em nossas vidas. Ao serem altamente lucrativos e de fácil extração, vêm evitando desenvolver energias limpas, como a solar e a eólica.

Que outros absurdos podemos esperar num desfile de insensatez? Neste 2020, quem recorda que, em 2019, no Brasil, o tiro ao alvo foi liberado até para crianças e adolescentes, como se ensinar a matar e destruir deva começar já na tenra infância?

Jornalista e escritor - FLÁVIO TAVARES

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