sábado, 26 de julho de 2025



26/07/2025 - 13h00min
Martha Medeiros

É pela imperfeição que me enamoro

Andamos obcecados por qualidade técnica, filtros que eliminam defeitos, nenhum ruído escapando, nenhum fio solto, a artificialidade substituindo o que é verdadeiro. Também somos aquele ser indefinido por trás do espelho embaçado no banheiro.

Meus pais sempre me pareceram, aos olhos da criança que fui, perfeitos. A Família Real de Porto Alegre. Eu agradecia a Deus por ter nascido em um lar tão abençoado, onde tudo funcionava, e ai de quem duvidasse. Até que cresci e passei eu mesma a duvidar: ora, quem é perfeito? Eu não iria pagar o mico de passar o resto da vida inebriada pela própria ilusão. Passei a glorificar o imperfeito e segui amando todos eles.

Resultado: até hoje mantenho atração pelo que não é 100%. Peguei ranço da correção absoluta. O 100% é uma certificação estática, aprisionada, não há mais para onde ir. Ora, de que jeito conceber a vida sem movimento? Estou longe de desprezar genialidades, como uma foto de Sebastião Salgado, uma página de Guimarães, o canto do Caetano, a entrega cênica das Fernandas, mãe e filha. Aproximam-se do sagrado. Mas quando desço desse altar e caio no mundano, é pela imperfeição que me enamoro. Meu coração é off-Broadway.

Todo esse preâmbulo para dizer que exalto o que está fora de foco. O abandono da excelência a favor da essência. Andamos obcecados por qualidade técnica, filtros que eliminam defeitos, nenhum ruído escapando, nenhum fio solto, a artificialidade substituindo o que é verdadeiro. A essência, ao contrário, é inexata, transcende, se move, esparrama. A essência não se falsifica, transforma a própria falha em gozo. Sabe que o excelente, ou é um gênio, ou um impostor.

Adoro, especialmente, fotos desfocadas, com sua imperfeição poética, humana. São retratos em movimento: da gente dançando, correndo, gesticulando. Somos borrões capturados por olhares objetivos, mas não há quem possa nos reduzir a uma única dimensão. Temos várias versões sobrepostas, somos reais e fictícios, seres indeterminados fazendo o possível para se enquadrar, só que um pedaço de nós sempre invade o contorno limitador e escorre para fora. Queremos ser vistos com nitidez, eu sei, mas também somos aquele ser indefinido por trás do espelho embaçado no banheiro. Estarei dando razão ao ébrio que enxerga três de nós, embriagado?

Está parecendo que quem bebeu fui eu, mas o álcool fica para depois: é a arte a única culpada pelos meus lampejos. Este texto foi inspirado por uma visita recente que fiz ao museu L´Orangerie, em Paris. A mostra chama-se Dans Le Flou e expõe várias obras, de 1945 até aqui, que foram criadas propositalmente desfocadas. São várias pinturas, fotos e trechos de filmes, e os curadores ainda criaram paredes translúcidas, para que a gente enxergue apenas o espectro dos outros visitantes na sala ao lado. Para quem tiver a sorte de estar por lá, a exposição fica até 18 de agosto. Saindo do museu, aí sim, tome um vinho por mim e divague à vontade, também. 


Checklist da alegria de viver

Da vida, não levamos nenhum bem, só experiências. Só o que lembramos, só como somos lembrados. Por mais que se aspire à fortuna, a maior riqueza é imaterial: emerge da simplicidade, do artesanato do afeto, do despojamento, da confiança de se impor diante da opinião alheia.

Há momentos que não podemos deixar de viver. É preciso, pelo menos, tentar alcançar. Não fugir do encontro. Não fugir da emoção.

Felicidade é um filme de baixo orçamento. Não dependemos de muito para sorrir. Felicidade consiste em estar presente. É se manter perto do próprio corpo. É quando a mente e o corpo estão no mesmo lugar.

Que tal fazer um checklist de alguns dos prazeres e aventuras que não devem faltar na sua história? São aquelas cenas indispensáveis numa comédia romântica com final feliz. São os porta-retratos que permanecem atrás das retinas, não dos vidros. Talvez não existam nem fotos, nem vídeos, porque você se esqueceu de registrar - tão ocupado que estava com o seu contentamento, não querendo perder um minuto da sua espontaneidade.

São instantes em que você suspira e diz: nem acredito. Não acreditar é começar a acreditar além dos seus limites.

( ) Ver a neve.

( ) Acompanhar o sol se levantando na praia.

( ) Acampar com colegas.

( ) Pular fogueira ou formar roda ao redor do fogo.

( ) Participar de excursão de ônibus da escola.

( ) Ganhar uma medalha em competição esportiva.

( ) Adormecer ao relento, olhando as estrelas.

( ) Andar de avião.

( ) Tomar banho de chuva.

( ) Festejar até de manhã, e ir dormir enquanto todos acordam.

( ) Ficar apaixonado.

( ) Amar alguém de verdade, a ponto de sonhar envelhecer junto.

( ) Ter um amigo para todas as horas.

( ) Passar a noite em claro, conversando com quem você acabou de conhecer.

( ) Atravessar o réveillon numa cidadezinha pacata.

( ) Entrar numa piscina de roupa.

( ) Plantar uma árvore e visitá-la anos depois.

( ) Fazer trilha e mergulhar numa cachoeira.

( ) Rezar por alguém, não só por si mesmo.

( ) Comer brigadeiro na panela.

( ) Reunir a família inteira num almoço.

( ) Comprar um mimo caro para os pais, que eles julgavam que não fosse possível.

( ) Conviver com a lealdade de um cachorro - ou com a astúcia de um gato.

( ) Viajar para longe e interagir em um idioma diferente.

( ) Chorar no cinema.

( ) Assistir a um show no gargarejo.

( ) Admirar a cidade do alto de uma roda-gigante ou de um arranha-céu.

( ) Rir até doer a barriga, até rolar no chão, até pedir para parar.

( ) Cantar sua canção favorita num karaokê.

( ) Escrever uma carta à mão e enviá-la pelo correio.

( ) Explorar a terra de origem dos seus bisavós.

( ) Cozinhar para um afeto.

( ) Beber um cálice de vinho no topo de um morro.

( ) Realizar piquenique no parque.

( ) Terminar um livro e sentir que transformou sua mente.

( ) Subir num palco.

( ) Dançar na sala sozinho.

( ) Perdoar mudando de assunto.

( ) Imaginar como o outro pensa - e descobrir que errou feio. Melhor perguntar do que adivinhar.

Se algum item ainda não foi riscado, está tudo bem: o tempo não cobra pressa, mas coragem. _

CARPINEJAR

26 de Julho de 2025
OPINIÃO - Opinião RBS

Ainda é preciso persistir na negociação

A menos de uma semana da entrada em vigor do tarifaço contra o Brasil prometido pelo presidente dos EUA, Donald Trump, não resta alternativa a não ser insistir na tentativa de abrir um diálogo com o governo norte-americano. A despeito da falta de interesse em negociar demonstrada até aqui pela Casa Branca, do lado brasileiro é dever esgotar todos os meios possíveis para encontrar algum avanço e evitar o pior cenário. 

Valem os esforços do Itamaraty, as buscas do vice-presidente Geraldo Alckmin para ter alguma interlocução com o primeiro escalão de Trump, as articulações da iniciativa privada junto a clientes, fornecedores e entidades empresariais norte-americanas e outros canais de conversação, como a delegação de senadores que vai a Washington.

O caráter político da chantagem de Trump dificulta ainda mais essa tarefa, é verdade. Afinal, o Brasil está prestes a enfrentar uma tarifa de 50% sobre as exportações para os EUA, o maior patamar até agora imposto pela Casa Branca, não por razões comerciais. Na carta enviada ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Trump citou os processos enfrentados pelo ex-presidente Jair Bolsonaro e decisões judiciais que atingem plataformas digitais norte-americanas, mas se especula também incômodo com a atuação do Brics, bloco de emergentes que tem o Brasil como um dos principais membros. As justificativas de Trump são tão estapafúrdias que, noticiou-se na sexta-feira, os EUA ainda buscam base legal para a medida.

Nos últimos dias surgiram alguns sinais incipientes de pontos que poderiam ser explorados nas tratativas. A soberania brasileira e a independência do Judiciário, convém reforçar, não estão na mesa de negociação. Mas se impõe reiterar o interesse em tratar de temas econômicos, demonstrando que ambos os países perdem com uma taxa de importação proibitiva.

Um dos indicativos de possibilidade de negociação foi revelado por Alckmin, que manteve teleconferência com o secretário de Comércio dos EUA, Howard Lutnick. Nas palavras do vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, o tom do diálogo foi o da busca pelo "ganha-ganha". Ou seja, com vantagens recíprocas. Em outra frente, senadores de diferentes linhas ideológicas terão compromissos a partir de segunda-feira com entidades empresariais e parlamentares norte-americanos.

Também foi revelado que, em reunião com o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), o encarregado de negócios da embaixada dos EUA no Brasil, Gabriel Escobar, manifestou o interesse norte-americano nos minerais críticos e estratégicos (MCEs) do país. Surge, portanto, outra pauta que pode evoluir. Negociar não significa entregar riquezas a estrangeiros, como sugere o nacionalismo embolorado, mas buscar conciliar benefícios para ambos os lados. A retórica agressiva de Lula, nesse sentido, atrapalha.

Ainda assim, é mandatório estar preparado para o cenário de o tarifaço de Trump ser praticado. Empresas e setores afetados necessitarão de apoio extraordinário. O governo federal já diz ter um cardápio de medidas. Na sexta-feira, o BRDE apresentou uma linha de crédito com juro subsidiado de R$ 100 milhões para as exportadoras gaúchas. Mas, mesmo que o tarifaço entre em vigor, deve ser mantida a racionalidade e a disposição para o entendimento. A retaliação é o último recurso. _

Conselho Editorial

José Galló

Empresário e membro do Conselho Editorial da RBS

contatoconselhoeditorial@gruporbs.com.br

A cacofonia do nosso tempo

A probabilidade de você ler este texto até a última linha é pequena. Não porque ele é mais ou menos interessante: simplesmente porque ingressamos na Era da Pressa.

A leitura de um texto ou a atenção dedicada a uma conversa não são mais as mesmas. As pessoas mal conseguem articular uma ideia antes de serem interrompidas. Todos nós estamos ansiosos, sem paciência, fazendo várias coisas ao mesmo tempo. Os debates se tornaram fragmentados. O raciocínio complexo tornou-se raridade. O tempo da reflexão, da análise, da qualidade das ideias se perdeu na urgência da reação imediata.

Essa pressa está comprometendo a vida. A leitura rápida de um título, de uma mensagem, o consumo fragmentado das redes sociais pode nos levar a avaliações superficiais e decisões erradas. Pensamentos mais elaborados mal têm tempo de se formar antes de chegar mais um alerta sonoro ou a tela acender mais uma vez. Definir o melhor a fazer exige ponderação, raciocínio e tempo. Mas cedemos lugar ao imediatismo, à urgência e à superficialidade.

Há poucos dias alguém me perguntou se é verdade que os Estados Unidos iriam lançar uma bomba no Brasil. Mas de onde surgiu isso? Dos boatos, delírios e teorias conspiratórias que pipocam a todo momento no nosso dia a dia. Tudo vira verdade, e assim vai se levando a vida aos trambolhões. O que deveria provocar indignação nos alerta para algo ainda mais grave: a erosão da capacidade coletiva de discernir o real do absurdo.

A cultura da urgência está também nas ruas. Observo, com frequência, carros amassados na traseira - e invariavelmente há um celular no painel, distraindo o motorista. A pressa está em todo lugar, como no trânsito, nos cortes bruscos, nas ultrapassagens forçadas, nas sinaleiras não respeitadas, nos atropelamentos, nas mortes evitáveis.

É nesse cenário de ruído e urgência que o jornalismo responsável precisa reafirmar sua vocação essencial: a verificação rigorosa dos fatos, a capacidade de análise e de mostrar contexto. A imprensa não é mais uma voz no caos: é um lugar de pausa, de profundidade e de responsabilidade. Quando tudo grita e nada mais tem valor, o conteúdo criterioso de uma reportagem bem apurada pode ser a diferença. Em tempos de decisões afobadas e vida sob pressão, a informação confiável torna-se não apenas necessária, mas vital. Que o jornalismo sério permaneça como farol, na contramão da crescente cacofonia de distrações e ruídos irrelevantes. 

OPINIÃO

26 de Julho de 2025
POLÍTICA E PODER - Rosane de Oliveira

Leite cobra de Lula o que está nas mãos de Trump

A linha de crédito especial do BRDE para os exportadores prejudicados pelo tarifaço de Donald Trump, anunciada na sexta-feira pelo governador Eduardo Leite, foi recebida com entusiasmo pelos representantes dos setores afetados, mas todos sabem que se trata de um paliativo.

O governo do Rio Grande do Sul fez o que estava ao seu alcance ao propor um empréstimo para evitar que o impacto imediato seja a demissão de trabalhadores. Com isso, dá fôlego às empresas, enquanto não se chega a um acordo para redução das tarifas.

Logo depois de anunciar o acordo, Leite voltou a dizer que a solução para o impasse está na negociação e que cabe ao presidente Lula dar o primeiro passo.

A sugestão seria óbvia, não fosse pública e notória a informação de que Trump não quer negociar com o Brasil e que a primeira condição por ele imposta não cabe em uma negociação legítima. É chantagem a exigência de livrar o ex-presidente Jair Bolsonaro da ação penal por tentativa de golpe de Estado.

Leite contestou a opinião de que sua sugestão de Lula dar o primeiro passo oscilava entre a ingenuidade e o oportunismo político. O secretário de Comunicação, Caio Tomazeli, traduziu o pensamento do governador como "a defesa de um gesto político de boa vontade". A ideia não é Lula viajar para os EUA sem uma audiência marcada, mas dar um telefonema para Trump.

Entusiasmado com o reconhecimento de que é o único entre os potenciais candidatos a presidente que não tem ligação com Lula nem com Jair Bolsonaro, o governador aproveitou a reunião para condenar a polarização, discurso que adotou logo após o anúncio do tarifaço, como se a responsabilidade de cada um fosse de 50%.

Ignorou que o deputado Eduardo Bolsonaro está nos EUA há quatro meses, tentando convencer autoridades americanas de que seu pai é vítima de uma injustiça e pedindo sanções. Mesmo quando a sanção veio em forma de tarifaço, Eduardo comemorou como vitória, imaginando que o Executivo, o Legislativo e o Judiciário se renderiam. _

Crise com os EUA reforça papel de Alckmin no governo

A crise do tarifaço colocou em evidência a figura serena do vice-presidente Geraldo Alckmin. É ele o interlocutor dos empresários e o homem escalado para conversar com o governo dos EUA, tarefa até aqui frustrada pela irredutibilidade de Donald Trump.

Na sexta-feira, em Osasco (SP), Lula ressaltou o papel de Alckmin na negociação:

- Esse cara é exímio negociador, não levanta a voz e não manda carta. Ele só quer conversar - discursou.

Na segunda-feira, os líderes dos setores mais prejudicados pelo tarifaço terão mais um encontro com Alckmin e com Lula em Brasília para discutir estratégias de reação e o programa do governo para socorrer as empresas afetadas. _

Avante quer o centro

Apontado como um dos partidos que negocia com o PL para 2026, o Avante nega qualquer conversa com Luciano Zucco ou Giovani Cherini, os dois principais líderes liberais no RS. Segundo o presidente estadual da legenda, Mário Cardoso, o Avante é um partido de centro e quer se afastar dos extremos.

Foi Cherini quem disse a jornalistas, antes do anúncio da coligação com o Novo, que tinha conversado com o Avante, o Solidariedade e o PSDB.

- Somos do diálogo, não tem problema falar com quem for, mas hoje o que buscamos é uma alternativa de centro - disse Mário.

As preferências do Avante são as pré-candidaturas de Marcelo Maranata (hoje no PDT, mas tem conversas com PSDB) e Juliana Brizola (PDT). Nomes da centro-direita, como Gabriel Souza (MDB) e Covatti Filho (PP), estão mais distantes. _

Eduardo Leite se prepara para tirar seis dias de férias na próxima semana. O governador vai aproveitar a última semana do recesso na Assembleia para descansar. Não há previsão de agendas que envolvam articulações para a eleição.

Definição do PL não deve apressar adversários

O lançamento antecipado dos principais nomes da futura coligação PL-Novo não deverá apressar o calendário de definições dos outros concorrentes que estão com as candidaturas alinhavadas.

Não é novidade para nenhum dos protagonistas da eleição que o MDB terá o vice-governador Gabriel Souza como candidato.

Quem estará com Gabriel? O PSD, por ser o partido do governador Eduardo Leite, mas não necessariamente como vice. O mais provável é que o próprio Leite seja candidato ao Senado, se não conseguir viabilizar a candidatura a presidente.

Gabriel gostaria de ter um nome do PP como vice, mas o deputado Covatti Filho está empolgado com a receptividade da pré-candidatura. A ala direita do PP resiste a Gabriel, porque no Interior o MDB é um adversário histórico. 

Esquerda vai se unir? A expectativa de união da centro-esquerda é o principal motivo para PT, PSOL, PCdoB e PSB evitarem nomes agora.

Para atrair o PDT, que tem Juliana Brizola como pré-candidata ao Piratini, líderes do PT adotaram o discurso de que quem busca uma aliança ampla não pode impor nomes.

O PSDB lançou a ex-prefeita de Pelotas Paula Mascarenhas, mas a direção nacional ainda não desistiu de filiar o prefeito de Guaíba, Marcelo Maranata, que quer concorrer a governador.

Nos bastidores, os petistas acreditam que a tendência é o PDT fechar com Gabriel Souza e Juliana concorrer a deputada federal. _

Manuela no radar

Edegar Pretto é o nome do PT para governador. Na improvável hipótese de uma aliança com o PDT, tendo Juliana como candidata, Pretto disputaria uma vaga na Câmara, já que para o Senado o nome do partido é Paulo Pimenta.

A segunda vaga ficaria para um partido aliado, provavelmente o PSB, que tenta atrair a ex-deputada Manuela D?Ávila, que deixou o PCdoB e é afinada com João Campos, presidente nacional do partido, que avalia decretar uma intervenção no diretório estadual do PSB e convidar Manuela para a presidência estadual.

O PSOL também tenta atrair Manuela, na esperança de ganhar um reforço para 2026. 

POLÍTICA E PODER


26 de Julho de 2025
INFORME ESPECIAL - Rodrigo Lopes

Minerais põem Brasil no mapa geopolítico do futuro

O apetite trumpiano por minerais críticos e terras raras lembra a fixação da Casa Branca em tratar a China como inimiga existencial. Muda o presidente, troca a retórica, mas certos consensos permanecem imutáveis em Washington - entre eles, a percepção da China como principal adversário global e a obsessão por garantir o controle de recursos estratégicos. Sai o democrata Joe Biden, entra o republicano Donald Trump, e o roteiro se repete: Pequim continua o vilão da vez - como já foram, em outros tempos, fascismo, soviéticos e fundamentalistas islâmicos.

A busca por minerais críticos insere-se nesse enredo. Com aplicação direta na indústria da defesa, no setor energético e na transição para uma economia de baixo carbono, esses minerais se tornaram peça-chave da geopolítica contemporânea. Não por acaso, o Brasil entrou no radar americano após declarações recentes do encarregado de Negócios da Embaixada dos EUA em Brasília, Gabriel Escobar, sobre o interesse de Washington em acordos por esses insumos.

Minerais como lítio, nióbio, tântalo, terras raras, entre outros, são usados em baterias de veículos elétricos, turbinas eólicas, sensores de mísseis, radares, drones e blindagens de última geração. O neodímio, disprósio e praseodímio, por exemplo, integram ímãs superpotentes utilizados em motores militares e aeronaves de combate. O gálio e o germânio são indispensáveis em semicondutores e sensores infravermelhos. 

O titânio, por leveza e resistência, é utilizado em submarinos e veículos blindados. E o tungstênio, com seu altíssimo ponto de fusão, é essencial em projéteis perfurantes e ligas bélicas. Isso sem falar em tântalo, berílio, níquel e cromo, aplicados em capacitores de precisão, turbinas de alta temperatura e sistemas eletrônicos estratégicos.

O interesse americano

A lista de minerais considerados críticos pelos EUA é composta por quase 15 elementos que não existem em abundância no subsolo americano. As maiores reservas estão em regiões como América Latina, Groenlândia (lembram da tentativa de Trump de comprar a ilha da Dinamarca?), sul da África, Austrália, China, Rússia, Ucrânia e Cazaquistão. O Brasil desponta com 14 minerais classificados como críticos, respondendo por 10% das reservas globais - localizadas principalmente nas regiões Sudeste, Nordeste e Norte.

Na gestão Biden, minerais críticos eram vistos como motores da economia verde. Mesmo que Trump despreze a pauta ambiental, seguem vitais para a segurança nacional e a estratégia de contenção global. E, agora, voltam ao centro do tabuleiro até nas propostas para encerrar a guerra na Ucrânia, como instrumento de pressão.

O que está em jogo é mais do que o controle de insumos industriais: é o poder sobre o futuro. Não há transição energética, revolução tecnológica nem soberania militar sem esses minerais. Em tempos de emergência climática e rearranjos geopolíticos, o mapa mineral vale mais ou tanto quanto os antigos mapas do petróleo. _

Referência em pesquisa sobre a Antártica, com inferências científicas no dia a dia dos gaúchos em tempos de mudanças ambientais, o Centro Polar e Climático da UFRGS tem novo site. Mais intuitivo, está em centropolar.com

Símbolo de resiliência

Olhando rapidamente lembra o Rio Grande do Sul em maio de 2024. Mas a cena foi registrada nas Filipinas, onde um casal decidiu manter a data do casamento, realizado no último dia 22, mesmo com a igreja alagada devido às chuvas intensas agravadas pelo tufão Wipha. A cerimônia ocorreu na histórica Igreja de Barasoain, em Malolos, na província de Bulacan, uma das regiões atingidas. Com os bancos parcialmente submersos, os convidados acompanharam a cerimônia com os pés na água, enquanto Jade Rick Verdillo e Jamaica Aguilar disseram sim.

- Estamos juntos há 10 anos. Este é só mais um desafio que superamos - declarou Rick. _

Casa dos Raros terá tratamento de neuromielite óptica

A partir de agosto, a Casa dos Raros, na Capital, inaugurará o primeiro centro exclusivo para tratamento de neuromielite óptica no Estado. O objetivo é facilitar a jornada do paciente, desde o diagnóstico até o tratamento e terapias multidisciplinares.

A neuromielite óptica é doença rara e grave que ataca o sistema nervoso central, principalmente o nervo óptico e a medula espinhal. Estima-se que 5 mil pessoas no Brasil convivam com ela. _

Sistema gaúcho de compostagem atrai interesse da COP30

Um sistema de compostagem desenvolvido por uma startup do Tecnopuc chamou a atenção dos organizadores da Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP30). A tecnologia, criada pela startup Igapó - integrante do Tecnopuc e vinculada ao Celeiro AgFood, vertical de negócios em agro e foodtech do instituto -, está em operação na Central de Resíduos da PUCRS desde novembro de 2024.

Recentemente, um representante da prefeitura de Belém, sede da COP30, visitou a universidade para conhecer o projeto em detalhes. A composteira em uso na PUCRS processa resíduos orgânicos com maior rapidez do que os equipamentos convencionais, com capacidade de até uma tonelada por dia.

A expectativa é de que um equipamento baseado na mesma tecnologia - porém em escala ampliada - seja instalado durante a COP30. _

Rede de ambientalistas denuncia desmonte

O Observatório do Clima (OC), principal rede de entidades ambientais do país, encaminhou nesta semana nota técnica ao governo federal defendendo o veto integral do projeto de lei 2159/21, que altera regras de licenciamento no país. O documento aponta que 42 dos 66 artigos do texto desmantelam o licenciamento ambiental.

A nota, de 95 páginas, baseia-se em análise técnica e afirma que a proposta é "incompatível com o interesse público e inconstitucional". Para a entidade, a eventual sanção das novas regras pode ameaçar proteção ambiental, saúde pública, povos e comunidades tradicionais, patrimônio histórico-cultural e sítios arqueológicos. A análise técnica foi entregue à Presidência da República e a 17 ministérios. _

INFORME ESPECIAL

sábado, 19 de julho de 2025


19/07/2025 - 13h51min
Martha Medeiros

Viajar é um vício, um prazer, um tratamento de saúde mental

Não é porque se está fora de casa que se pode agir feito um ogro, desrespeitando o silêncio alheio e a cultura de cada povo. Com adesão voluntária é melhor não contar: ninguém vai deixar de renovar o passaporte.

A pandemia trancou 7 bilhões de pessoas em casa. Quando acabou, éramos 7 bilhões de estressados, com abstinência de liberdade e craques em trabalhar online. Debandamos, claro. As vielas de Veneza hoje parecem formigueiros humanos, comprometendo o patrimônio histórico e elevando o custo de vida de quem lá nasceu, mas quem se importa, além dos moradores? Veneza é só um exemplo da invasão em massa. 

Protestos têm sido feitos nos mais cobiçados destinos turísticos, mas levantar cartazes têm pouco efeito prático. Alguns nativos reagem infantilmente, como os barceloneses que apontam pistolas d’água para os turistas. Com os termômetros batendo os quarenta graus, fazem até um favor a quem se arrasta pelas Ramblas com uma mochila pesada nas costas.

Alguns londrinos adotaram uma forma mais radical de expulsar os chatos. Desde quando foi lançado o filme Um Lugar Chamado Notting Hill, o bairro passou a concentrar alto índice de visitantes que fazem questão de conhecer a livraria “do Hugh Grant” e o conjunto de casas coloridas que dá um ar brejeiro à região. Pois alguns moradores, exaustos de verem seus jardins invadidos por turistas em busca do melhor ângulo para fotografar as fachadas, resolveram pintar suas casas de preto. Adeus, amarelinho, rosinha, azulzinho. Casas pretas. Notting Hill versão Família Addams.

Em Paris, há duas semanas, funcionários do Louvre organizaram uma greve relâmpago e fecharam as portas, deixando os turistas do lado de fora, com ingresso na mão, sem entender nada. Reivindicavam um limite de visitação, antes que o caos se instale no famoso museu. E nos aeroportos, na entrada das salas vip, as filas também andam gigantes. O que era para ser uma área destinada a poucos, se tornou acessível a todos, devido a ampliação das vantagens oferecidas pelos cartões de crédito. O benefício é vendido como “premium”, mas o que se vê é uma horda disputando o pão de queijo grátis.

Difícil reverter a situação, uma vez que o turismo impulsiona a economia mundial. Estudam-se paliativos, como exigir taxas de entrada nas cidades, impedir a construção de novos hotéis em zonas centrais e estimular a visita a lugares ainda não explorados, os tais paraísos secretos. 

Com adesão voluntária é melhor não contar: ninguém vai deixar de renovar o passaporte. Viajar é um vício, um prazer, um tratamento de saúde mental. Eu adoraria que Porto Alegre recebesse mais turistas – até que alguém invada meu jardim e perturbe a minha paz, logo, educação turística vai ter que entrar na pauta. Não é porque se está fora de casa que se pode agir feito um ogro, desrespeitando o silêncio alheio e a cultura de cada povo. Mas enquanto não se organiza essa barafunda, pistola d’água em nós. 



04/07/2025 - 17h00min
Sara Bodowsky

Passeie comigo por uma das minhas regiões preferidas do Rio Grande do Sul: o sul do Estado

Confira a nossa visita no Theatro Sete de Abril, um dos mais antigos em solo gaúcho, no quadro "Na Estrada" do "Baita Sábado"

Eu amo viajar, seja qual destino for. Todo o povo e todo o lugar têm histórias únicas. E a experiência de viver e observar essas narrativas muda nossa própria perspectiva. 

Por isso sou uma entusiasta do movimento. De descobrir espaços próximos ou mais distantes. Não importa. O que precisamos é seguir abrindo a mente e o coração para o que está fora da nossa caixa. Da nossa (não tão) confortável bolha. 

Cada encontro semanal nosso, aqui na coluna, me deixa muito feliz porque sei que tu, leitora e leitor, também se sente provocado por essas descobertas. Seja de lugares, de sabores, de saber fazer. 

Sou muito feliz quando recebo tua sugestão também, ou quanto tu divides comigo o quanto curtiu alguma coisa que leu aqui. Um beijo, que a gente siga juntos saindo das nossas bolhas e descobrindo o mundo!

Neste sábado tem Na Estrada, na RBS TV, mais cedo: o Baita Sábado começa às 9h. Te convido para passear comigo por uma das minhas regiões preferidas do Rio Grande do Sul: o sul do Estado. 

Nossa equipe fez um passeio especial pelo centro histórico de Pelotas, onde tivemos uma surpresa inesperada, que foi um verdadeiro presente – a possibilidade de entrar no Theatro Sete de Abril, um dos mais antigos do RS. 

Foi inaugurado em dezembro de 1834, um pouco mais de 23 anos antes do que o São Pedro, em Porto Alegre, e está fechado há 15 anos. No entanto, a reabertura está próxima, dependendo ainda de alguns detalhes de estrutura e acústica. Foi uma visita emocionante!

Se quiser conferir também no Globoplay, é só buscar por Baita Sábado. O acesso é grátis, só precisa fazer uma conta e assistir. 

Um dos lugares com a melhor vista do pôr do sol de Porto Alegre, o Lola Bar, que fica no terraço da Casa de Cultura Mario Quintana, comemora 13 anos com programações muito bacanas. É a tua oportunidade de revisitar a casa ou, quem sabe, finalmente conhecer esse espaço charmoso, acolhedor e muito diverso. 

Na próxima terça-feira, dia 8, tem Majestic Sessions a partir das 18h. O projeto é comandando pelo querido Dante Longo e terá como convidado especial o jornalista Roger Lerina. Será apresentada uma seleção especial de grooves, soul e raridades musicais dos anos 1970 e 1980, combinadas com projeções de filmes italianos. 

Já no dia 20, tem Bailinho do Lola a partir das 16h. O show comemorativo será com a banda Baby Paloma, que traz no repertório nomes clássicos como Marvin Gaye, Jorge Ben, Rita Lee e Steve Wonder. O Lola Bar fica no terraço da Casa de Cultura Mario Quintana (Rua dos Andradas, 736), no 7º andar. Tem mais informações no Instagram @lolaccmq. 

Sou fã de marmitas e não nego. Sejam preparadas por mim ou por marcas que mantêm a qualidade e o sabor caseiro, ajudam demais a manter a boa alimentação durante a correria da semana. E uma das minhas preferidas é a Tchê Gourmet, que está completando 10 anos em Porto Alegre. 

No aniversário, estão trazendo pratos novos, com combinações de arroz com galinha, panquecas com carne moída, peixe à milanesa, almôndegas, carne de panela e sobrecoxa ao molho, sempre acompanhados de arroz, feijão ou outras delícias. 

A Tchê Gourmet tem loja na Avenita Otto Niemeyer, 1.699, bairro Camaquã. Aberto de segunda a sexta-feira, das 9h às 18h, e sábado das 9h às 15h. Pedidos podem ser feitos pelo WhatsApp (51) 99196-6695 ou pelo Instagram @tche_gourmet. 



19 de Julho de 2025
Carlos Redel
COM A PALAVRA -Paulo Vieira - Ator e humorista

Com a Palavra

"O meu verdadeiro patrão é o público brasileiro"

Apresentado recentemente por Pedro Bial como o humorista "mais renovador dos últimos tempos", Paulo Vieira conversou com Zero Hora sobre as filmagens de Avisa Lá Que Eu Vou em duas cidades gaúchas, seu carisma junto ao público e os planos para o futuro.

Em Triunfo, do Emicida, enxergo algumas conexões contigo - adaptando o rap para o entretenimento - quando ele diz: "O rap me escolheu porque eu aguento ser real". Tu és esse cara que aguenta ser real num mundo cada vez mais artificial? E te consideras um porta-voz de quem não é ouvido?

São coisas que espero que as pessoas digam sobre mim. Busco essa fala das pessoas que me assistem. Tento fazer coisas que façam sentido para o meu coração. Um dos meus objetivos, por exemplo, é criar um trabalho autoral que reconheça o Brasil e a nossa cultura e que, ao mesmo tempo, seja divertido. Fico muito feliz quando as pessoas se sentem valorizadas por esse trabalho. Um dos propósitos do Avisa Lá Que Eu Vou é dar luz para pessoas que nunca tiveram voz.

Vamos falar do Avisa Lá Que Eu Vou. O primeiro episódio foi em Monte Belo do Sul, no Rio Grande do Sul. Como foi essa experiência?

Gravamos dois programas: um em Monte Belo do Sul e outro em Ametista do Sul, que vai ao ar no final da temporada. Foi muito legal gravar esses programas, fomos extremamente bem tratados. Já fiz muito show de stand-up comedy pelo Estado no início da minha carreira, e sempre gostei muito, sobretudo, do gaúcho rural. É uma terra de gente trabalhadora, e me identifiquei com esse lugar do rural. Acho que o homem do campo e a mulher do campo são parecidos no Brasil inteiro. Desde quando começamos o Avisa Lá, a gente queria fazer o Sul, e começamos a pesquisar. Às vezes, a gente queria fazer um evento no Rio Grande do Sul, mas a agenda não permitia. Então, foi bom que calhou de a gente estar gravando essa temporada, nessa época, para gente conseguir cobrir o polentaço.

Como tu escolhes estes lugares para gravar? Como é o garimpo por esses personagens curiosos?

Às vezes, é através de temas ou de pessoas. Por exemplo, falei: "Cara, quero muito fazer o Rio Grande do Sul tradicional". Encontramos o polentaço e os personagens. Também descobrimos Ametista do Sul, que tem um monte de empreendimento debaixo da cidade. Quase uma cidade em dois andares. A gente chega nisso pesquisando. A curadoria é tentar ampliar na cabeça do público o conceito que eles têm do Brasil. A nossa ideia é surpreender quem está assistindo: "Caramba, isso é no Brasil? Aqui tem isso também?". E fazer com que a pessoa que é daquele lugar se sinta valorizada e feliz.

E essa proximidade de sentar-se e conversar com todo mundo tão diferente como se fossem amigos?

É uma coisa muito natural. Meu pai fala assim: "O emprego do Paulo é conversar fiado". Gosto muito de conversar, e eu nunca chego como uma celebridade. Trato todo mundo com muito respeito e amor. E acho que as pessoas sentem isso e correspondem na mesma medida. O meu olhar para o entrevistado é sempre um olhar de igualdade.

Das quatro temporadas de Avisa Lá Que Eu Vou, qual foi a situação mais pitoresca que aconteceu?

Tem tantas. Tenho até dificuldade, mas poderia te falar algumas coisas que me marcaram. Por exemplo, a gente ensaiou o enterro de um cara que organizou o próprio funeral. Fomos lá e fizemos tudo para que ele pudesse ver - o enterramos vivo. Isso, pra mim, é a cara do Avisa Lá, é muito doido. Nessa nova temporada, entrevistamos um casal de vampiros, a filha do Lampião e da Maria Bonita. A cada cidade que vamos, fico mais encantado e impressionado com o tanto de história rica que o Brasil tem.

E o Pablo e o Luisão? Como foi o processo de expor a intimidade da sua família e, ao mesmo tempo, criar algo que dialoga com outras famílias brasileiras?

Ele é o último passo de um processo de desenvolvimento e amadurecimento do meu trabalho. Nas duas pontas, tanto na minha linguagem como artista quanto a aposta da TV Globo no meu trabalho. É uma série que tem tudo a ver com a minha trajetória e, ao mesmo tempo, é absolutamente pessoal, feita no meu quarto. Se você assistir o Avisa Lá Que Eu Vou, você vai ver como Pablo e Luisão é influenciado pelo programa. Eles são o mesmo trabalho, praticamente. Então, tento sempre pensar qual será o próximo passo artístico, mas sempre com o objetivo de me comunicar com o povo. Quero ser, sempre, um comunicador popular. É para o povo que eu trabalho. A TV Globo é um veículo para o meu trabalho, mas o meu verdadeiro patrão, para quem eu trabalho mesmo, é o público brasileiro. Pablo e Luisão é uma série toda pensada para esse público. E é aquela coisa: quanto mais você fala de si mesmo, mais você fala do mundo inteiro.

O que vem pela frente? Ouvi boatos sobre um programa de auditório, inclusive...

Eu queria muito descansar. Estou querendo ficar um tempo quieto (risos). Mas tem algumas coisas ainda para cumprir. Devo fazer mais uma temporada do Devolve Aí para o Fantástico, que é um quadro que deu muito certo, além do Melhores do Ano. E, ao que tudo indica, devo gravar um filme ainda este ano, mas não será de comédia. Não sei a quantas anda essa história de programa de auditório. Mas quero seguir fazendo o Avisa Lá Que Eu Vou por, pelo menos, umas 10 temporadas. Mas agora a minha prioridade está sendo ficar mais quieto, dar uma descansada.

Para fecharmos, só para a gente voltar naquela primeira pergunta, que era sobre a música do Emicida, Triunfo. Tu achas que o Paulo Vieira, hoje, triunfou?

Não. No frigir dos ovos, somos todos trabalhadores, operários dessa indústria. Está todo mundo batalhando sempre pelo próximo projeto. Me sinto orgulhoso da minha história e de onde cheguei. Mas a palavra triunfar parece uma ideia de ter conquistado um lugar. Acho que as coisas não são tão sólidas, acho que elas apenas estão. Eu estou feliz e orgulhoso onde estou agora. Isso já é bom, dá um conforto no coração. Não vou botar objetivo, não. Mas uma hora a gente triunfa. 


OPINIÃO DA RBS

Um freio na trama da família Bolsonaro

Foi a própria família Bolsonaro que não deixou alternativas a não ser a determinação de medidas restritivas contra o ex-presidente por obstrução de justiça e para que fosse evitada uma eventual fuga do país. 

Foram os próprios deputado licenciado Eduardo Bolsonaro e o pai, Jair Bolsonaro, que mais de uma vez apontaram como razão para os EUA chantagearem o Brasil com tarifas punitivas de 50% o processo em que o ex-mandatário é réu por tentativa de golpe de Estado. Foram eles, também, que condicionaram um eventual recuo do presidente norte-americano, Donald Trump, à aprovação de anistia aos envolvidos na tentativa de ruptura institucional no país, em que Jair seria o principal beneficiado.

Foi o próprio Eduardo, em autoexílio nos EUA desde março, que evocou para si o mérito de ter influenciado uma  o de direito.

As medidas impostas pelo ministro do STF Alexandre de Moraes contra Jair Bolsonaro, que atenderam a pedido da Procuradoria-Geral da República (PRG) e foram cumpridas na sexta-feira pela Polícia Federal (PF), incluem a colocação de tornozeleira eletrônica, a proibição de uso das redes sociais e de contato com Eduardo, embaixadores e diplomatas estrangeiros e outros investigados, além da determinação para permanecer em casa entre 19h e 6h. Uma possível fuga de Bolsonaro era hipótese que nada tinha de esdrúxula. Basta lembrar que o ex-presidente, temendo ser preso após ter o passaporte apreendido, passou dois dias na embaixada da Hungria, no Carnaval de 2024.

As atitudes de Jair Bolsonaro, como réu em ação penal, e da família, mostram a confiança de que o capital político e a massa de apoiadores de que dispõem seriam suficientes para que pairassem acima da lei. Ao esticarem a corda, não deixaram margem para o sistema judicial do país que não fosse uma reação contundente. 

Não é de se descartar que, em novo passo de tensionamento, Trump no mínimo dificulte as negociações empresariais e diplomáticas do Brasil para rever o tarifaço que inviabiliza exportações e traz incertezas à economia do país. Ainda assim, era dever reafirmar institucionalmente que cabe somente ao Brasil decidir sobre seus temas internos. 


19 de Julho de 2025
GPS DA ECONOMIA - Marta Sfredo

Ação da PF tem risco Trump, mas família já ameaçava

Exportadores que acordaram com imagens da ação da Polícia Federal na casa de Jair Bolsonaro em Brasília sentiram um calafrio na espinha. Desde que o presidente dos Estados Unidos publicou a carta em que ameaça o Brasil com tarifa de 50% explicitando motivação política, ficou clara a relação de causa e consequência entre Donald Trump e a situação do ex-presidente brasileiro.

Por isso, é possível que às medidas já adotadas contra o Brasil pelo atual ocupante da Casa Branca, somem-se outras diante do agravamento da situação de Bolsonaro. No entanto, conforme informações dadas em tom ameaçador pelo seu filho, o ainda deputado federal Eduardo Bolsonaro, isso poderia ocorrer mesmo que seu pai não tivesse sido obrigado a usar tornozeleira eletrônica.

Não satisfeito em escrever uma nota, assinada também por Paulo Figueiredo, autoproclamado "jornalista em exílio", reivindicando a responsabilidade pelas medidas punitivas de Trump, o filho 03 gravou entrevista para a GloboNews afirmando que poderia vir "mais coisa" contra o Brasil do governo dos EUA. Assim, a própria família espalhou a tese de que, com ou sem reação da Justiça, poderiam ser adotadas novas medidas contra o Brasil.

A afirmação, diante do quadro já preocupante das consequências econômicas do tarifaço e com as que podem advir do processo de investigação comercial contra o Brasil no USTR - também anunciado na carta - foi mais uma manifestação de que o interesse familiar está acima de todo e qualquer país ou divindade.

A declaração da véspera de Bolsonaro - "se me der um passaporte, negocio" - acabou contribuindo para a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de imposição de uso de tornozeleira e proibição de utilização das redes sociais e da aproximação de embaixadas.

Possíveis ameaças

Até agora, já foram acionados três tipos de instrumentos: uma alíquota setorial de 50% sobre aço, alumínio e cobre - sobre a qual ainda há dúvida se é ou não cumulativa, porque vale para todos os países -, o tarifaço de 50% e a investigação contra "práticas desleais" - que inclui o Pix - pelo Representante de Comércio dos Estados Unidos (USTR na sigla em inglês).

Parece muito, especialmente para um país que gera superávit para os EUA nas trocas de produtos, com um tipo de comércio cuja interrupção gera consequências negativas não só para o Brasil, mas para empresas e cidadãos americanos. Infelizmente, tem mais. Veja ao lado. _

Lei de Comércio de 1974: a seção 301 baseou a investigação do USTR. Prevê "medidas comerciais coercitivas" como forma de pressão para a abertura de mercados. Pode resultar na aplicação de tarifas adicionais - que se somariam aos 50% -, cotas (limites quantitativos às exportações - e outras restrições.

Lei de Expansão Comercial de 1962: a seção 232 permite limitar importações consideradas "ameaça à segurança nacional". Tem sido usada para justificar tarifas setoriais, como a de 50% sobre aço, alumínio e cobre, sob a alegação de proteção à indústria estratégica americana.

Lei de Poderes Econômicos de Emergência Internacional de 1977: autoriza o presidente dos EUA a bloquear transações financeiras e confiscar bens de países ou grupos. Foi a base legal do "Dia da Libertação".

Lei Antidumping: prevê medidas compensatórias ante venda a preços inferiores aos de mercado. Pode impor as chamadas "tarifas ad valorem", ou seja, adicionar um valor determinado ao preço dos produtos afetados pela medida.

Sanções econômicas: podem ser definidas no Congresso ou por decreto. São executadas pelo Escritório de Controle de Ativos Estrangeiros (Ofac, na sigla em inglês), baseadas na Lei de Poderes Econômicos de Emergência Internacional (Ieepa, na sigla em inglês) e na Lei de Comércio com o Inimigo (Twea, na sigla em inglês).

Mais "sabida", GurIA ganha nova tarefa. A GurIA, assistente virtual do governo do Estado baseada em inteligência artificial generativa, ficou mais "sabida". Agora, aprendeu o suficiente para responder sobre o Plano Rio Grande, programa de reconstrução, adaptação e resiliência climática do Rio Grande do Sul.

A atualização estará disponível a partir de segunda-feira. O novo conteúdo se soma às orientações disponíveis desde o lançamento da nova estratégia digital do governo, em junho.

Desde o lançamento, em 5 de junho, a GurIA já teve 52 mil conversas iniciadas e 285 mil mensagens trocadas. O atendimento está disponível 24 horas, sete dias por semana, no portal rs.gov.br e no WhatsApp oficial do governo gaúcho, no (51) 3210-3939. _

Ao menos até o início da noite de sexta-feira, Donald Trump não havia dado um pio sobre o caso de Jair Bolsonaro. E teve várias oportunidades. O que isso significa? Quase nada. Mas é digno de nota.

R$ 5,587

foi o fechamento do dólar na sexta-feira, por temor de eventual reação de Donald Trump às medidas cautelares do STF sobre Jair Bolsonaro. Foi na contramão de movimentos de outras moedas. A bolsa caiu cerca de 1,6%, em outro sinal de cautela ante um final de semana mais imprevisível do que o habitual.

GPS DA ECONOMIA

19 de Julho de 2025
JUDICIÁRIO E TECNOLOGIA

Uso da inteligência artificial avança no TJ

Judiciário e tecnologia

Em um mês desde o lançamento, a IA do Tribunal de Justiça gaúcho produziu 95 mil minutas que, após revisão humana, vêm se transformando em decisões judiciais. Uso da ferramenta visa elevar a produtividade e minimizar erros cometidos por pessoas

Gabriel Jacobsen

Decisões judiciais já estão sendo tomadas com o auxílio de inteligência artificial (IA) no Brasil. Com a promessa de aumentar a produtividade do Judiciário e minimizar erros humanos, as IAs se tornaram realidade em dezenas de tribunais que adotam a tecnologia em diferentes etapas dos processos - desde a distribuição das ações, passando pelo exame de provas e argumentações, até a redação das sentenças.

No Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), em cerca de um mês de operação (desde 12 de junho), a IA nomeada Gaia Minuta produziu mais de 95 mil minutas, rascunhos de decisões - das quais milhares já foram publicadas e se tornaram despachos em processos. O dado foi obtido com exclusividade por Zero Hora junto à Corte.

As sentenças e os votos produzidos a partir das IAs do Judiciário não podem ser publicados sem revisão humana. A lógica esperada do juiz ou do desembargador é de que o magistrado primeiro use a IA para compreender bem o caso, depois forme internamente a sua convicção e, somente então, peça para a IA redigir a decisão.

Procedimento

Na plataforma do TJ para gerar uma decisão com IA, o magistrado primeiro insere um comando de texto, o prompt, dizendo se quer, por exemplo, condenar ou inocentar um acusado por determinado crime. Ou se decidiu prover ou rejeitar determinado recurso. No comando, o juiz pode apontar os elementos que a IA deve considerar para redigir a sentença. Em geral, em menos de um minuto, o rascunho da decisão judicial aparece na tela.

A partir daí, se abre um segundo momento, considerado fundamental pelo TJRS para preservar o papel do ser humano no processo de julgar: a revisão. Se concordar com o texto feito pela IA, o magistrado clica e transforma a minuta em uma decisão judicial com todos os seus efeitos. Senão, o juiz pode pedir à IA novas versões ou fazer manualmente alterações no documento.

- Não poderíamos perder a essência de julgar. O juiz não pode abrir mão disso. A gente não pode pensar em abrir mão da jurisdição, senão o Estado perde. Quando o juiz delega a sua atividade, ele não está sendo juiz. A IA vai produzir uma decisão no mesmo contexto que um assessor meu produziria - defende o desembargador Antonio Vinicius Amaro da Silveira, presidente do Conselho de Inovação e Tecnologia do TJRS.

Sem "alucinação"

O Gaia Minuta opera sob dois motores de IA mundialmente conhecidos: o Claude, desenvolvido pela Anthropic e oferecido pela Amazon, e o Gemini, do Google. Semelhantes ao famoso ChatGPT, são IAs do tipo "generativa" e, portanto, capazes de criar conteúdos novos em vez de apenas automatizar procedimentos.

Ao criar, as IAs generativas frequentemente "alucinam", termo usado quando essas tecnologias inventam informações inverídicas ou inexistentes. Para reduzir a chance de "alucinação", as IAs do TJRS operam sob parâmetros restritos definidos pela Corte, como busca exclusiva de informações no banco de dados do Judiciário. Em outras palavras, a IA do TJRS não pode pesquisar livremente na internet.

- A IA vai te ajudar a construir a redação da decisão, mas ela não vai decidir por ti. Uso a IA, primeiro, para produzir um resumo do processo. Então, me decido e só depois faço a decisão com o Gaia Minuta. E depois vou lá revisar a minuta, porque as LLMs (grandes modelos de linguagem das IAs generativas) podem "alucinar" - destaca o desembargador Clóvis Moacyr Mattana Ramos, da 15ª Câmara Cível do TJRS, um dos precursores no uso de IA na Corte.

Resolução do Conselho Nacional de Justiça definiu as regras do uso da IA no Judiciário. Apesar da permissão, os magistrados seguem integralmente responsáveis pelas decisões. _

Acerto de 97%

O uso de IA pela TJRS começou a ser testado, de forma incipiente, em 2023. A virada foi em 2024, após a cheia que atingiu o RS - incluindo parte das instalações do tribunal.

Ao longo de 21 dias, em processo emergencial, a Corte migrou todos os seus sistemas e dados para a nuvem, o que permitiu o uso dos motores globais de IA, hoje em operação.

A IA do TJRS foi lançada oficialmente em 12 de junho de 2025, após meses de programação e treinamento.

Segundo a Corte, a plataforma erra em 3% dos casos. O índice é considerado muito positivo e superior ao que hoje é atingido pelo trabalho exclusivamente humano. A meta é diminuir à medida que a IA vai aprendendo.

Olhar no histórico ou análises novas

Para limitar a postura "criadora" das IAs generativas, a aplicação no TJRS é programada para resolver os impasses do presente com base nas decisões já tomadas por cada magistrado em casos anteriores semelhantes. A meta é garantir a coerência jurídica e textual de cada julgador.

Os juízes, contudo, também se deparam com casos novos, nunca antes enfrentados por eles ou pelo tribunal onde atuam. Além disso, ao longo da carreira, os magistrados podem mudar de entendimento sobre temas já julgados, seja por transformações próprias ou da sociedade. Nessas situações, a melhor colaboração da IA é para a análise do processo.

- A análise em situações novas não pode ser feita com uma minuta de uma IA generativa, mas ela será de enorme valia na análise dos dados. Um dos grandes méritos da IA, principalmente em processos complexos, é a capacidade de absorção de grande quantidade de dados - pondera o desembargador Ricardo Hermann, coordenador do Comitê de Governança de Segurança da Informação do TJRS. _

Em busca de decisões mais rápidas

Consideradas as peculiaridades de cada área e de cada caso, a meta da Justiça gaúcha é ter, com a inteligência artificial, a produtividade de gabinetes como o do desembargador Clóvis Moacyr Mattana Ramos. Por lá, a maior parte dos processos é julgada em até um dia, respeitados os prazos processuais.

Zero Hora visitou o gabinete de Mattana Ramos, no 13º andar do TJRS, em uma segunda-feira. O sistema interno mostrava 10 processos distribuídos entre três assessores, todos recebidos, no máximo, um dia antes.

- Tenho 10 processos e, quase todos, de hoje, segunda-feira. O mais antigo aqui deve ser de sexta. Então, se consegue fazer com que as coisas sejam apreciadas no mesmo dia. Claro, um ou outro processo pode demorar mais, demanda mais. Mas a gente conseguiu reduzir o tempo de tramitação. Eu preciso me decidir, mas na hora de construir a decisão é muito mais rápido - conta Ramos.

A juíza Taise Velasquez Lopes, da 4ª Vara Criminal de Caxias do Sul, também passou a usar a inteligência artificial. Nos primeiros dias, conta, testou a IA pedindo que ela produzisse sentenças para casos em que os humanos já haviam realizado antes o trabalho, buscando comparar os resultados. A avaliação foi de alta qualidade, não apenas para produção das minutas, mas com ganho de tempo, especialmente na análise do processo.

Apesar da perspectiva positiva, a juíza criminal tem avançado com cuidado. Nestas primeiras semanas, ela conta que se sente mais confortável de usar a IA quando está decidida a inocentar do que nos casos em que formou convicção de condenação. 


19 de Julho de 2025
JUDICIÁRIO E TECNOLOGIA

JUDICIÁRIO E TECNOLOGIA

Uso da inteligência artificial avança no TJ

Judiciário e tecnologia

Em um mês desde o lançamento, a IA do Tribunal de Justiça gaúcho produziu 95 mil minutas que, após revisão humana, vêm se transformando em decisões judiciais. Uso da ferramenta visa elevar a produtividade e minimizar erros cometidos por pessoas

Gabriel Jacobsen

Decisões judiciais já estão sendo tomadas com o auxílio de inteligência artificial (IA) no Brasil. Com a promessa de aumentar a produtividade do Judiciário e minimizar erros humanos, as IAs se tornaram realidade em dezenas de tribunais que adotam a tecnologia em diferentes etapas dos processos - desde a distribuição das ações, passando pelo exame de provas e argumentações, até a redação das sentenças.

No Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), em cerca de um mês de operação (desde 12 de junho), a IA nomeada Gaia Minuta produziu mais de 95 mil minutas, rascunhos de decisões - das quais milhares já foram publicadas e se tornaram despachos em processos. O dado foi obtido com exclusividade por Zero Hora junto à Corte.

As sentenças e os votos produzidos a partir das IAs do Judiciário não podem ser publicados sem revisão humana. A lógica esperada do juiz ou do desembargador é de que o magistrado primeiro use a IA para compreender bem o caso, depois forme internamente a sua convicção e, somente então, peça para a IA redigir a decisão.

Procedimento

Na plataforma do TJ para gerar uma decisão com IA, o magistrado primeiro insere um comando de texto, o prompt, dizendo se quer, por exemplo, condenar ou inocentar um acusado por determinado crime. Ou se decidiu prover ou rejeitar determinado recurso. No comando, o juiz pode apontar os elementos que a IA deve considerar para redigir a sentença. Em geral, em menos de um minuto, o rascunho da decisão judicial aparece na tela.

A partir daí, se abre um segundo momento, considerado fundamental pelo TJRS para preservar o papel do ser humano no processo de julgar: a revisão. Se concordar com o texto feito pela IA, o magistrado clica e transforma a minuta em uma decisão judicial com todos os seus efeitos. Senão, o juiz pode pedir à IA novas versões ou fazer manualmente alterações no documento.

- Não poderíamos perder a essência de julgar. O juiz não pode abrir mão disso. A gente não pode pensar em abrir mão da jurisdição, senão o Estado perde. Quando o juiz delega a sua atividade, ele não está sendo juiz. A IA vai produzir uma decisão no mesmo contexto que um assessor meu produziria - defende o desembargador Antonio Vinicius Amaro da Silveira, presidente do Conselho de Inovação e Tecnologia do TJRS.

Sem "alucinação"

O Gaia Minuta opera sob dois motores de IA mundialmente conhecidos: o Claude, desenvolvido pela Anthropic e oferecido pela Amazon, e o Gemini, do Google. Semelhantes ao famoso ChatGPT, são IAs do tipo "generativa" e, portanto, capazes de criar conteúdos novos em vez de apenas automatizar procedimentos.

Ao criar, as IAs generativas frequentemente "alucinam", termo usado quando essas tecnologias inventam informações inverídicas ou inexistentes. Para reduzir a chance de "alucinação", as IAs do TJRS operam sob parâmetros restritos definidos pela Corte, como busca exclusiva de informações no banco de dados do Judiciário. Em outras palavras, a IA do TJRS não pode pesquisar livremente na internet.

- A IA vai te ajudar a construir a redação da decisão, mas ela não vai decidir por ti. Uso a IA, primeiro, para produzir um resumo do processo. Então, me decido e só depois faço a decisão com o Gaia Minuta. E depois vou lá revisar a minuta, porque as LLMs (grandes modelos de linguagem das IAs generativas) podem "alucinar" - destaca o desembargador Clóvis Moacyr Mattana Ramos, da 15ª Câmara Cível do TJRS, um dos precursores no uso de IA na Corte.

Resolução do Conselho Nacional de Justiça definiu as regras do uso da IA no Judiciário. Apesar da permissão, os magistrados seguem integralmente responsáveis pelas decisões. _

Acerto de 97%

O uso de IA pela TJRS começou a ser testado, de forma incipiente, em 2023. A virada foi em 2024, após a cheia que atingiu o RS - incluindo parte das instalações do tribunal.

Ao longo de 21 dias, em processo emergencial, a Corte migrou todos os seus sistemas e dados para a nuvem, o que permitiu o uso dos motores globais de IA, hoje em operação.

A IA do TJRS foi lançada oficialmente em 12 de junho de 2025, após meses de programação e treinamento.

Segundo a Corte, a plataforma erra em 3% dos casos. O índice é considerado muito positivo e superior ao que hoje é atingido pelo trabalho exclusivamente humano. A meta é diminuir à medida que a IA vai aprendendo.

Olhar no histórico ou análises novas

Para limitar a postura "criadora" das IAs generativas, a aplicação no TJRS é programada para resolver os impasses do presente com base nas decisões já tomadas por cada magistrado em casos anteriores semelhantes. A meta é garantir a coerência jurídica e textual de cada julgador.

Os juízes, contudo, também se deparam com casos novos, nunca antes enfrentados por eles ou pelo tribunal onde atuam. Além disso, ao longo da carreira, os magistrados podem mudar de entendimento sobre temas já julgados, seja por transformações próprias ou da sociedade. Nessas situações, a melhor colaboração da IA é para a análise do processo.

- A análise em situações novas não pode ser feita com uma minuta de uma IA generativa, mas ela será de enorme valia na análise dos dados. Um dos grandes méritos da IA, principalmente em processos complexos, é a capacidade de absorção de grande quantidade de dados - pondera o desembargador Ricardo Hermann, coordenador do Comitê de Governança de Segurança da Informação do TJRS. _

Em busca de decisões mais rápidas

Consideradas as peculiaridades de cada área e de cada caso, a meta da Justiça gaúcha é ter, com a inteligência artificial, a produtividade de gabinetes como o do desembargador Clóvis Moacyr Mattana Ramos. Por lá, a maior parte dos processos é julgada em até um dia, respeitados os prazos processuais.

Zero Hora visitou o gabinete de Mattana Ramos, no 13º andar do TJRS, em uma segunda-feira. O sistema interno mostrava 10 processos distribuídos entre três assessores, todos recebidos, no máximo, um dia antes.

- Tenho 10 processos e, quase todos, de hoje, segunda-feira. O mais antigo aqui deve ser de sexta. Então, se consegue fazer com que as coisas sejam apreciadas no mesmo dia. Claro, um ou outro processo pode demorar mais, demanda mais. Mas a gente conseguiu reduzir o tempo de tramitação. Eu preciso me decidir, mas na hora de construir a decisão é muito mais rápido - conta Ramos.

A juíza Taise Velasquez Lopes, da 4ª Vara Criminal de Caxias do Sul, também passou a usar a inteligência artificial. Nos primeiros dias, conta, testou a IA pedindo que ela produzisse sentenças para casos em que os humanos já haviam realizado antes o trabalho, buscando comparar os resultados. A avaliação foi de alta qualidade, não apenas para produção das minutas, mas com ganho de tempo, especialmente na análise do processo.

Apesar da perspectiva positiva, a juíza criminal tem avançado com cuidado. Nestas primeiras semanas, ela conta que se sente mais confortável de usar a IA quando está decidida a inocentar do que nos casos em que formou convicção de condenação. 


Medidas de Trump aceleraram o cerco a Jair Bolsonaro

Em seu afã de transformar política externa em favorecimento dos amigos, o presidente dos EUA, Donald Trump, acelerou o cerco a Jair Bolsonaro. O julgamento do ex-presidente brasileiro provavelmente terminará em setembro, com a sentença expedida pelo Supremo Tribunal Federal (STF), mas as declarações de Trump obrigaram a Justiça a tomar medidas extras para evitar a possível fuga de Bolsonaro ou seu refúgio em alguma embaixada em Brasília - americana, argentina ou húngara, nesta ordem.

A articulação iniciada por Eduardo Bolsonaro nos EUA, no intuito de eximir o pai do jugo da lei, acabou por potencializar sua derrocada. Nos últimos dias, Trump elevou o tom - primeiro, era a ameaça de imposição de tarifas em 50% ao Brasil, o único país no mundo cuja metralhadora-giratória do americano atingirá uma nação cuja relação comercial é superavitária.

Depois, sua ordem foi determinante para que o Escritório de Representação Comercial dos Estados Unidos (em inglês, USTR) iniciasse uma investigação tão esdrúxula que colocou no mesmo balaio plataformas digitais, suposta preocupação com o desmatamento na Amazônia, etanol e Pix. Por fim, uma carta assinada pessoalmente por Trump exigindo anistia de Bolsonaro feriu ainda mais a soberania nacional e tratou o Brasil como uma república bananeira.

O compadrio de Trump fez a PF desconfiar de que Bolsonaro estava próximo de iniciar uma operação definitiva para escapar. Agora, caso Bolsonaro se aproxime do Setor de Embaixadas Sul ou Norte, em Brasília, o sinal da tornozeleira eletrônica vai disparar e ele será preso. O cerco não apenas se fechou em torno de Bolsonaro como Trump se encarregou de apressá-lo. _

Porto Alegre pede mais recursos para a saúde

O secretário de Saúde da Capital, Fernando Ritter, pediu ao ministro da Saúde, Alexandre Padilha, o aumento da oferta de OCI?s - Ofertas de Cuidado Integrado - para a saúde da cidade. Padilha cumpriu agenda em Porto Alegre na sexta-feira, e os dois se encontram à noite.

No entendimento do secretário, a medida, que libera mais recursos federais, tem ajudado a zerar filas de espera por atendimentos represados na cidade.

Conforme a secretaria, Porto Alegre registrava um crescimento de cerca de 5 mil pessoas na fila para atendimentos por mês. Com o lançamento, no fim do ano passado, do programa Mais Especialistas, do governo federal, foi possível estabilizar esse número, e, a partir de abril, com a implementação das OCI?s - estratégia de atendimento que oferece um fluxo contínuo e integral ao paciente -, a fila diminuiu ainda mais.

Diante dos bons resultados, Ritter vai pedir que o ministro avalie o envio de mais ofertas para a Capital. Com isso, espera zerar outras filas, de mamografia, cardiologia adulto, otorrinolaringologia adulto e oftalmologia pediátrica.

Antes, o paciente realizava a consulta e, caso necessitasse de algum exame ou procedimento, voltava para a fila de tratamento para os outros serviços. A partir do momento em que a secretaria executa uma OCI, o foco é no atendimento integral do paciente. _

Câmara de Comércio e consulado italiano na Expointer

Dois meses após a retomada dos trabalhos, a Câmara de Comércio Italiana do RS terá um estande oficial no Pavilhão Internacional da Expointer, em parceria com o Consulado-Geral da Itália no RS, para a exposição de empresas e atração de novos negócios. A colaboração foi definida na sexta-feira, durante jantar alusivo aos 150 anos da imigração italiana, em Passo Fundo.

Será a primeira participação da Câmara em uma grande feira de negócios. Nesta nova fase, sob gestão de Erasmo Battistella e dos vices-presidentes Gelson Castellan e Neco Argenta, a entidade busca ampliar o número de associados para aumentar o volume de negócios entre Rio Grande do Sul e Itália - inclusive, com a ambição de levar marcas gaúchas para a Europa. O estande na Expointer terá cerca de 100 metros quadrados. _

Entrevista - David Driesen - Professor americano e especialista em Direito Constitucional

"Vejo os tribunais brasileiros como defensores da democracia"

Especialista em Direito Constitucional e autor do livro O Espectro da Ditadura, o professor americano David Driesen vai palestrar segunda-feira, no Instituto Ling, na Capital, sobre o papel do Judiciário na preservação da democracia. A palestra terá mediação do ex-vice-prefeito Ricardo Gomes.

Em seu livro, o senhor alerta sobre o risco de um presidencialismo autoritário favorecido por decisões da Suprema Corte. Com a volta Donald Trump, acredita que os riscos se intensificam?

Sim, os riscos se intensificaram. O Estado de direito foi amplamente abolido no nível federal. O Poder Executivo está cumprindo os desejos de Trump, em vez de executar a lei fielmente.

Trump tem adotado imposição de tarifas no Brasil, exigindo, para retirá-las, reversão de decisões do STF. Há violação de soberania?

Sim, eu consideraria as exigências de Trump inconsistentes com a soberania nacional. Isso me lembra o que Trump fez em seu primeiro mandato. Ele reteve armas da Ucrânia para forçar Volodimir Zelensky a investigar Hunter Biden (filho do ex-presidente Joe Biden), o que levou ao seu primeiro processo de impeachment.

O Supremo brasileiro tem sido protagonista na contenção de ameaças autoritárias, mas também concentra poder por meio de decisões monocráticas com impacto político. Isso pode, a longo prazo, representar riscos semelhantes aos que o senhor alerta dos EUA?

Tanto os tribunais brasileiros quanto a Suprema Corte dos EUA exercem muito poder, mas vejo a Suprema Corte dos EUA como um perigo para a democracia, e os tribunais brasileiros como defensores da democracia. A Suprema Corte americana emitiu muitas decisões impedindo o Judiciário de aplicar a lei contra Trump, facilitando, assim, os ataques ao Estado de direito. Os tribunais brasileiros intervieram para coibir ataques à democracia brasileira e à corrupção. Essa é uma abordagem muito diferente.

Há, no Brasil, tendência de o STF atuar no vácuo do Legislativo. Essa mistura de funções não prejudica a democracia?

De forma geral, presidentes e primeiros-ministros instituem ditaduras, não tribunais. Os tribunais às vezes controlam autocratas e às vezes os capacitam. Mas tribunais são "o ramo menos perigoso" do governo e podem prejudicar democracias, não derrotá-las. _

Quando? 21 de julho (segunda-feira), às 19h. Local? Instituto Ling (Porto Alegre)

As inscrições para a confraria do IBEF-RS são abertas para associados e não sócios do instituto. Sócios pagam R$ 90. Para não sócios: R$ 181.

INFORME ESPECIAL 

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