segunda-feira, 15 de setembro de 2025


15 de Setembro de 2025
CLÁUDIA LAITANO

O papel do jornal

Em 2016, comemorei o Oscar de melhor filme por motivos estritamente corporativistas. Spotlight não é uma obra-prima (na lista do New York Times dos cem melhores do século 21, ficou na sexagésima-sexta posição), mas conta uma história que, por motivos óbvios, sempre me comove: jornalistas fazendo bom jornalismo.

Nem todos os filmes sobre o dia a dia de uma redação são sobre grandes reportagens investigativas como a narrada em Spotlight. O gênero "vida de jornalista" é tão vasto que comporta subgêneros. Amo os dramas clássicos, como Cidadão Kane e A Montanha dos Sete Abutres, mas também as comédias elegantes, como Jejum de Amor e A Mulher do Ano. Gosto de jornalistas cobrindo guerras (O Ano em que Vivemos em Perigo) e de jovens repórteres correndo atrás de estrelas do rock (Quase Famosos). 

Adoro jornalões de papel mudando o curso da História (Todos os Homens do Presidente) e filmes que mostram os bastidores de telejornais (Network). Não me importa que a trama seja de suspense (The Parallax View), surrealista (The French Dispatch) ou quase colada no noticiário (como o filme Ela Disse e a série The Newsroom): se tem jornalista trabalhando, já é um bom motivo para assistir.

Quando a série The Paper estreou aqui nos Estados Unidos, no início de setembro, eu tinha, portanto, dois bons motivos para querer conferir: o cenário é a redação de um pequeno jornal quase falido e, mais importante, a produção é um spinoff da série The Office (2005 - 2013), uma das minhas favoritas. Logo no início, deu para perceber que a nova série não seria tão engraçada quanto a original, apesar do exato mesmo formato de pseudodocumentário e das muitas piscadelas para os fãs de Michael Scott (Steve Carell) e seus colegas de escritório. 

À medida em que ia assistindo aos episódios, fui notando que não apenas eu não estava achando muita graça como estava começando a ficar deprimida. Era para ser uma comédia, mas, na verdade, a série narra uma história dramática que ainda está se desenrolando: a crise do jornalismo, não apenas como modelo de negócio, mas como maneira de pensar o mundo. The Paper talvez seja a primeira obra do gênero "vida de jornalista" a colocar esse drama em primeiro plano, ainda que de forma irônica.

A abertura da série brinca com o fato de que, no inglês, a mesma palavra, "paper", significa tanto "jornal" quanto "papel". Vemos jornais usados para embrulhar o peixe, forrar janelas e cobrir bandejas sendo descartados na lata de lixo onde se lê a palavra "paper". Como se a iminente extinção do suporte físico, que muitos de nós ainda amamos, fosse o prenúncio de um destino muito mais trágico: um futuro em que o próprio jornalismo seja considerado descartável. _

O conteúdo desta coluna reflete a opinião do autor

CLÁUDIA LAITANO

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