segunda-feira, 25 de agosto de 2025


25 de Agosto de 2025
CLÁUDIA AITANO

Apocalipse anunciado

Fico imaginando Marty McFly, o viajante do tempo de De Volta para o Futuro, ou qualquer outro visitante imaginário do século 21 por acaso de passagem por Porto Alegre em 1985, tentando me explicar como a Internet transformaria a maneira como as pessoas trabalham, se comunicam, fazem compras, se divertem, namoram. E mais: que tudo isso começaria a mudar muito antes do que eu pensava, dali a pouco menos de 10 anos. (Disclaimer: em 1985, nem secretária eletrônica tinha lá em casa.)

Explicar o Tinder, o WhatsApp, o TikTok, o Uber, os aplicativos de banco, a Netflix, os satélites na Amazônia, o smartphone e o gabinete do ódio seria apenas o começo. Depois de 15 minutos, McFly já estaria exausto, e eu ainda não saberia da missa a metade.

Àquela altura, fora dos livros de ficção científica, ninguém parecia muito preocupado com os perigos da nova tecnologia. A maioria das pessoas sabia tão pouco sobre computadores que seria incapaz de alimentar ansiedades muito concretas em relação ao futuro. (Em retrospecto, penso que muitos de nós, pais da chamada "geração ansiosa", gostaríamos de ter sido um pouco mais educados para a paranoia tecnológica nos anos 1990, quando ainda dava tempo de evitar o empanturramento digital das crianças. Carregamos essa culpa. Mais essa.)

Em 2025, as viagens no tempo continuam rolando apenas na imaginação, mas a quantidade de gente fazendo previsões para o futuro aumentou muito - assim como a paranoia. O campo favorito de especulação agora é a Inteligência Artificial, como até o observador mais distraído já percebeu. Não passa um dia sem que surja um aspecto novo, em geral assustador, com potencial para transformar um mundo que já não é grande coisa em algo ainda mais caótico e desigual.

Apenas na semana que passou, colecionei notícias sobre suicídio ("O que minha filha disse ao ChatGPT antes de tirar a própria vida"), desaparecimento de empregos ("40 profissionais com o maior risco de serem substituídos pela IA"), superconsumo de energia ("Data centers estão aumentando a conta de luz de todos"), prejuízos ao aprendizado ("IA está alimentando a pobreza da Imaginação") e manipulação de imagens em vídeos falsos ("O que eu não disse sobre Sydney Sweeney"). Em um mesmo dia, li um texto apocalíptico ("Os pessimistas da IA estão ficando cada vez mais pessimistas") e outro que supostamente deveria me deixar mais tranquila ("IA pode ser meio que normal").

Minha sensação, de vez em quando, é que estão tentando explicar a Internet para quem mal aprendeu a operar uma secretária eletrônica sem se atrapalhar com os botões. _

CLÁUDIA AITANO

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