sábado, 30 de agosto de 2025


30 de Agosto de 2025
ANDRESSA XAVIER

Jogo jogado

Há julgamentos que começam antes de o tribunal se reunir. O do ex-presidente Jair Bolsonaro é um deles. A data no calendário do Supremo Tribunal Federal, que reunirá a atenção do país a partir desta semana, apenas oficializa o que já se desenha nos corredores, nas análises de bastidores e nas expectativas da opinião pública: o resultado é previsível. A condenação não será uma surpresa, mas a confirmação de um roteiro que o próprio Bolsonaro ajudou a escrever.

A insistência em flertar com o autoritarismo, a tentativa de mudar as regras do jogo e a incapacidade de aceitar a derrota nas urnas colocaram Bolsonaro e sua trupe diante de um tribunal que não julga apenas um ato, mas o modus operandi. É o acerto de contas entre o que se espera da liturgia democrática e quem a desrespeitou, ou a testou, de forma sistemática.

Não se trata apenas de um processo jurídico. É também um julgamento simbólico, de caráter histórico. A democracia brasileira, tão jovem e ainda marcada por cicatrizes, precisa dar respostas claras quando testada. O Supremo, desta vez, não julga apenas Bolsonaro, mas a resiliência das instituições diante de um projeto de poder que não se conforma com limites.

Todos sabem o que virá. Não haverá absolvição milagrosa, surpresas e nem espaço para vitimização convincente. O resultado já está assimilado até por aliados, que hoje medem cada palavra de apoio ou, em casos extremos, somem. Mas o que se abre depois da sentença é mais complexo. A condenação isola Bolsonaro politicamente, mas não elimina a polarização que ele consolidou. O eleitor que o seguiu, o fiel, não desaparece com a decisão do tribunal. O bolsonarismo, como fenômeno social, sobrevive, nesse caso apesar de seu líder. Assim como, lá atrás, o lulismo sobreviveu à série de escândalos de corrupção que culminaram na prisão de Lula.

Hoje todos sabem o desfecho jurídico do caso Bolsonaro, mas ninguém sabe qual será o desfecho político. Afastado do centro da disputa formal, o ex-presidente se torna ainda mais mito para os convertidos. A história brasileira, que acabo de citar, mostra que a prisão não significa necessariamente o fim de uma carreira política e que as brechas jurídicas e políticas podem nos surpreender. Lula esteve atrás das grades e voltou ao Planalto.

O Brasil assiste, assim, a um julgamento com duas camadas. Na superfície, a punição de um homem que afrontou a lei. Em profundidade, repetir que o país não aceitará mais aventuras golpistas. Por ora, o que todos sabem é o resultado que está para ser anunciado. O resto, como sempre na política brasileira, continua em aberto. Espero que o Brasil consiga enxergar além dos fanatismos em torno de dois nomes. O país é maior que isso. 

ANDRESSA XAVIER

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