sábado, 11 de outubro de 2025


Um Nobel da Paz pela democracia

Uma das consequências da escolha da venezuelana María Corina Machado para o Prêmio Nobel da Paz de 2025 é fazer a comunidade internacional, em meio a tantos conflitos e turbulências nos quatro cantos do globo, também voltar as atenções para os arbítrios do regime de Nicolás Maduro. A láurea, afinal, não desperta apenas a curiosidade sobre a trajetória da líder oposicionista, mas faz com que sejam relembrados todos os abusos da autocracia chavista, como as graves violações de direitos humanos, as eleições de fachada, o domínio do Legislativo e do Judiciário e uma crise econômica crônica que forçou o êxodo de mais de 8 milhões de cidadãos.

O Comitê Norueguês do Nobel explicou na sexta-feira que premiou María Corina pelos esforços incansáveis na busca pelos direitos dos venezuelanos e pelo empenho "para alcançar uma transição justa e pacífica da ditadura para a democracia". Não há dúvida sobre o destemor da ex-deputada ao decidir se manter no país, ainda que na clandestinidade, apesar do risco que corre. Só com muita coragem é possível continuar a enfrentar um governo que prende adversários ao bel-prazer e é acusado pelo Conselho de Direitos Humanos da ONU de barbáries contra opositores, como estupros e execuções extrajudiciais.

Não fosse a determinação de Maduro para se manter no poder custe o que custar, até para escapar da punição por seus crimes em série, é provável que María Corina fosse hoje a presidente da Venezuela. Ela foi a vencedora das primárias da oposição em 2023 para ser a desafiante do presidente - no cargo desde 2013 - nas eleições no ano passado. Mas, em uma manobra farsesca, a Suprema Corte do país a declarou impedida de concorrer, em roteiro semelhante ao imposto a outros adversários políticos. Ao fim, Maduro foi à disputa em julho do ano passado com Edmundo González Urrutia e se declarou vencedor em um pleito com fartíssimos sinais de fraude.

A premiação a María Corina terá ainda maior valor se servir de motivação para opositores e descontentes com o regime se organizarem e se mobilizarem ainda mais para buscar formas de fazer a Venezuela voltar a viver sob um Estado democrático de direito. Também tem o poder de constranger as alas mais jurássicas da esquerda latino-americana, presentes também no Brasil, que, movidas pelo espírito embolorado da época da guerra fria, seguem condescendentes com a opressão de Maduro. O Nobel da Paz é uma chancela sobre os méritos de quem não se intimida com uma ditadura e um imunizante contra tentativas de diminuir o peso da distinção por viés ideológico. Governos tiranos são sempre deploráveis, pouco importa a coloração política.

É de se esperar que o reconhecimento pela primeira vez conferido a uma mulher da América do Sul colabore para uma futura mudança de ares na Venezuela, tanto pelo entusiasmo interno como por uma maior pressão da comunidade internacional por vias diplomáticas. Mas sem que se recorra à violência ou a qualquer intervenção armada. É temerária, por exemplo, a ameaça militar norte-americana que paira no Mar do Caribe. Afinal, como sublinhou o comitê do Nobel, os méritos de María Corina estão nos esforços para uma transição pacífica para a democracia. Essa é a mensagem.  

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