sábado, 25 de outubro de 2025


O caçador de escândalos

A ótima série documental Collor, o Caçador de Marajás, que estreou no Globoplay, é um vívido retrato de como um playboy que farreava no Rio de Janeiro passa de político provinciano a presidente apresentando-se, nas primeiras eleições diretas após o regime militar, como algoz de corruptos, e sofre impeachment tragado pelo próprio esquema de corrupção.

Vista pelas lentes de três décadas e meia depois, a trajetória de Fernando Collor de Mello exibida na série de sete capítulos é uma síntese de como o bom e ingênuo povo brasileiro volta e meia cai na conversa de políticos fantasiados de salvadores da pátria. Mas O Caçador de Marajás também tem como sujeitos outros personagens raramente observados de perto no dia a dia da política: a família e os amigões do presidente que se esgueiram pelos bastidores do poder.

No caso de Collor, combinaram-se fatores em abundância para sua derrocada. Os visíveis: inflação descontrolada depois de um confisco inútil, escândalos em profusão e povo na rua. E há os que só vieram à tona pelo fórceps da imprensa investigativa e de uma CPI que deu em algo: o testa de ferro das negociatas palacianas, Paulo César Farias, e o irmão Pedro Collor, que implode todo o esquema com uma entrevista bombástica.

Na aparência, a família de Collor era um comercial de margarina. Uma matriarca amorosa, irmãos unidos, uma esposa devota. Na prática, a dinastia viveu o que ficaria conhecido como a maldição da Casa Dinda, residência do ex-presidente. A mãe, Leda Collor, morre no auge da crise sem que os dois irmãos compareçam ao enterro. Fernando Collor está hoje em prisão domiciliar, a esposa leal, Rosane Malta, se separa em 2005 com um divórcio rumoroso, livro de memórias e ação na Justiça, e o irmão Pedro sucumbe aos 42 anos, dois anos após as denúncias, de um câncer fulminante. Resta sua viúva, Tereza Collor, que, sob os holofotes, foi batizada de Musa do Impeachment e presta o depoimento mais revelador sobre as entranhas da família.

É conhecida, e razoavelmente aceita, a influência de primeiras-damas sobre presidentes, embora ela geralmente ocorra na intimidade do casal. Já o peso da família estendida e a energia que rusgas familiares consomem dos governos quase sempre passam ao largo dos olhos públicos. Por tradição, no Brasil pouco se envereda pela vida pessoal de governantes, o que é compreensível quando ela não afeta a vida pública. Mas, como mostra a série da Globoplay, sempre que se elege um presidente é recomendável que se esquadrinhe o pacote que vem junto: o cônjuge, os irmãos, os filhos, os cunhados e os amigos íntimos. São eles que podem transformar também a vida do país em um inferno. _

MARCELO RECH

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